quinta-feira, 26 de maio de 2016

ÁFRICA NA ERA DO TRÁFICO DE ESCRAVOS - By Vieira Miguel Manuel



REPÚBLICA DE ANGOLA
GOVERNO DA PROVÍNCIA DE LUANDA
GABINETE PROVINCIAL DA EDUCAÇÃO DE LUANDA
ESCOLA DO II CICLO DO ENSINO SECUNDÁRIO N.º 4083 – JICA
CURSO DE CIÊNCIAS ECONÓMICAS E JURÍDICAS

                                            








HISTÓRIA





ÁFRICA NA ERA DO TRÁFICO DE ESCRAVOS



















LUANDA
2016

ESCOLA DO II CICLO DO ENSINO SECUNDÁRIO N.º 4083 – JICA
CURSO DE CIÊNCIAS ECONÓMICAS E JURÍDICAS 







HISTÓRIA




ÁFRICA NA ERA DO TRÁFICO DE ESCRAVOS


INTEGRANTES:

Nº 16 – Constância Gonga Mutango
Nº 21 – Emília P. Paulino
Nº 22 – Esperança Alberto de Sousa Tavares
Nº 24 – Eunice António da Costa
Nº 49 – Pedro da Costa Paiva
Nº 51 – Quelina Matias Chipenda
Nº 56 – Sónia Pinto Fernando

Classe: 10ª
Grupo nº: 04
Turma: TX4
Período: Tarde
Sala: 04


Trabalho apresentado ao Curso de Ciências Físicas e Biológicas na disciplina de História como requisito parcial para obtenção de notas.


Orientadora: Ernestina Marcolino da Silva




LUANDA
2016

SUMÁRIO






 




No presente trabalho sob o tema: “África na era do Tráfico de Escravos”, será destacada a importância do estudo do processo de escravização dos povos africanos pois é essencial para que se compreenda a situação actual de desigualdade no planeta. Revela uma longa história de exploração e subjugação de populações fragilizadas por outras mais equipadas. Demonstra também que a desestruturação económica e cultural tem efeitos desastrosos de longa duração. Todavia, do ponto de vista económico, a escravidão foi uma forma eficiente de acumulação primitiva. No que diz respeito às pessoas, foi uma violência irreparável, que pressupõe, dentre outros factores, a existência de povos muito pobres. Assim, parte do actual contexto socioeconómico da África de miséria e exclusão é consequência de fatos passados.

De notar que, por conta de deficiências bibliográficas relacionadas ao tema proposto, para o presente estudo será usado com mais frequência o termo ‘colonialismo’ ao invés de ‘tráfico de escravos’, pois, desse jeito foi mais fácil a pesquisa bem como a elaboração do presente trabalho. Assim, será considerado neste trabalho: A África diante do desafio colonial; iniciativas e resistências africanas; consequências e relevância da resistência africana, o colonialismo em África, etc.












Na história da África jamais se sucederam tantas e tão rápidas mudanças como durante o período entre 1880 e 1935. Na verdade, as mudanças mais importantes, mais espectaculares – e também mais trágicas –, ocorreram num lapso de tempo bem mais curto, de 1880 a 1910, marcado pela conquista e ocupação de quase todo o continente africano pelas potências imperialistas e, depois, pela instauração do sistema colonial. A fase posterior a 1910 caracterizou -se essencialmente pela consolidação e exploração do sistema.

O desenvolvimento desse drama foi verdadeiramente espantoso, pois até 1880 apenas algumas áreas bastante restritas da África estavam sob a dominação directa de europeus. Em toda a África ocidental, essa dominação limitava -se às zonas costeiras e ilhas do Senegal, à cidade de Freetown e seus arredores (que hoje fazem parte de Serra Leoa), às regiões meridionais da Costa do Ouro (actual Gana), ao litoral de Abidjan, na Costa do Marfim, e de Porto Novo, no Daomé (actual Benin), e à ilha de Lagos (no que consiste actualmente a Nigéria). Na África setentrional, em 1880, os franceses tinham colonizado apenas a Argélia. Da África oriental, nem um só palmo de terra havia tombado em mãos de qualquer potência europeia, enquanto, na África central, o poder exercido pelos portugueses restringia -se a algumas faixas costeiras de Moçambique e Angola. Só na África meridional é que a dominação estrangeira se achava firmemente implantada, estendendo -se largamente pelo interior da região.

Até 1880, em cerca de 80% do seu território, a África era governada por seus próprios reis, rainhas, chefes de clãs e de linhagens, em impérios, reinos, comunidades e unidades políticas de porte e natureza variados. No entanto, nos trinta anos seguintes, assiste -se a uma transmutação extraordinária, para não dizer radical, dessa situação. Em 1914, com a única excepção da Etiópia e da Libéria, a África inteira vê -se submetida à dominação de potências europeias e dividida em colónias de dimensões diversas, mas de modo geral, muito mais extensas do que as formações políticas preexistentes e, muitas vezes, com pouca ou nenhuma relação com elas. Nessa época, aliás, a África não é assaltada apenas na sua soberania e na sua independência, mas também em seus valores culturais.

A colonização constitui apenas uma empreitada militar e económica, posteriormente defendida por um regime administrativo apropriado; para os argelinos, contudo, é uma verdadeira revolução, que vem transtornar todo um antigo mundo de crenças e ideias, um modo secular de existência. Coloca todo um povo diante de súbita mudança. Uma nação inteira, sem estar preparada para isso, vê-se obrigada a se adaptar ou, se não, sucumbir. Tal situação conduz necessariamente a um desequilíbrio moral e material, cuja esterilidade não está longe da desintegração completa[1].
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Essas observações sobre a natureza do colonialismo valem não só para a colonização francesa da Argélia mas para toda a colonização europeia da África, sendo as diferenças de grau e não de género, de forma e não de fundo. Em outras palavras, durante o período entre 1880 e 1935, a África teve de enfrentar um desafio particularmente ameaçador: o desafio do colonialismo.


Eis uma questão ainda não estudada em profundidade pelos historiadores, tanto africanos como europeus, que, no entanto, precisa ser respondida. E a resposta é clara e inequívoca: na sua esmagadora maioria, autoridades e dirigentes africanos foram profundamente, a essa mudança e declararam-se decididos a manter o status quo e, sobretudo, a assegurar sua soberania e independência, pelas quais praticamente nenhum deles estava disposto a transigir, por menos que fosse. Tal resposta pode ser encontrada nas declarações dos dirigentes africanos da época.

Em 1891, quando os britânicos ofereceram protecção a Prempeh I, rei dos Ashanti, na Costa do Ouro (actual Gana), ele replicou:

A proposta para o país Ashanti, na presente situação, colocar-se sob a protecção de Sua Majestade, a Rainha e Imperatriz da Índia, foi objecto de exame aprofundado, mas me permitam dizer que chegamos à seguinte conclusão: meu reino, o Ashanti, jamais aderirá a uma tal política. O país Ashanti deve continuar a manter, como até agora, laços de amizade com todos os brancos. Não é por ufanismo que escrevo isto, mas tendo clareza do significado das palavras [...]. A causa dos Ashanti progride, e nenhum Ashanti tem a menor razão para se preocupar com o futuro ou para acreditar, por um só instante, que as hostilidades passadas tenham prejudicado a nossa causa[2].
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Em 1895, Wogobo, o Moro Naba, ou rei dos Mossi (na actual República do Alto Volta), declarou ao oficial francês, capitão Destenave:

Sei que os brancos querem me matar para tomar o meu país, e, ainda assim, você insiste em que eles me ajudarão a organizá-lo. Por mim, acho que meu país está muito bem como está. Não preciso deles. Sei o que me falta e o que desejo: tenho meus próprios mercadores; considere -se feliz por não mandar cortar -lhe a cabeça. Parta agora mesmo e, principalmente, não volte nunca mais.[3]

Em 1883, Lat-Dior, o damel de Cayor (no actual Senegal), em 1890, Machemba, chefe dos Yao de Tanganica (actual Tanzânia) e Hendrik Wittboi, um dos soberanos da região que hoje constitui a Namíbia, , tiveram a mesma atitude em face do colonizador. Mas um dos últimos e mais fascinantes testemunhos que gostaríamos de citar aqui é o emocionante apelo lançado em Abril de 1891 por Menelik, imperador da Etiópia, à rainha Vitória, da Inglaterra.

Fica assim evidente, com a leitura de algumas citações aqui feitas, que numerosos dirigentes africanos, de fato, acolheram muito favoravelmente as inovações que com regularidade foram sendo introduzidas depois do primeiro terço do século XIX, pois até então elas não tinham feito pesar nenhuma ameaça sobre sua soberania e independência. Na África ocidental, por exemplo, os missionários fundaram, em Serra Leoa, já em 1826, o Fourah Bay College, assim como escolas primárias e duas escolas secundárias, uma na Costa do Ouro e a outra na Nigéria, nos anos de 1870.





Convém examinar aqui brevemente o problema da periodização da história do colonialismo na África, ignorado por numerosos historiadores, mas levantado por A. B. Davidson e Michael Crowder na década de 1960.

Certos autores propuseram 1870 como data do início da “corrida” europeia para a África e da imposição do domínio colonial. Essa data, no entanto, parece um pouco recuada. G. N. Uzoigwe mostra que foram as actividades dos franceses na região da Senegâmbia, do rei Leopoldo da Bélgica, representado por H. M. Stanley, dos franceses, por Pierre Savorgnan de Brazza na região do Congo, e dos portugueses na África central que desencadearam a corrida. Ora, está claro que nenhuma dessas actividades começou antes do final da década de 1870 e do início da de 1880. Parece, portanto, que 1880 é um ponto de partida mais apropriado do que 1870. De 1880 até a derrocada do colonialismo, nas décadas de 1960 e 1970, o estudo da dominação colonial, das reacções e das iniciativas africanas deveria ser dividido em três períodos.

 O primeiro iria de 1880 a 1919 (com duas subdivisões: 18801900 e 19001919, correspondendo respectivamente à conquista e à ocupação). É aquilo que chamaríamos de período da defesa da soberania e da independência africanas mediante o recurso à estratégia do confronto, da aliança ou da submissão temporária. O segundo iria de 1919 a 1935: é o período da adaptação, sendo a estratégia empregada a do protesto ou a da resistência. O terceiro, com início em 1935, é o período dos movimentos de independência, sendo de acção concreta a estratégia[4].



A geração de 18801914 assistiu a uma das mutações históricas mais significativas
dos tempos modernos. Com efeito, foi no decorrer desse período que a África, um continente com cerca de trinta milhões de quilómetros quadrados, se viu retalhada, subjugada e efectivamente ocupada pelas nações industrializadas da Europa. Os historiadores até agora não têm a dimensão real das consequências desastrosas, quer para o colonizado quer para o colonizador, desse período de guerras contínuas, embora em geral sublinhem que se tratou de uma época de transformações revolucionárias fundamentais.

A importância dessa fase histórica, no entanto, vai muito além da guerra e das transformações que a caracterizaram. No passado, impérios ergueramse e desmoronaram, conquistas e usurpações também são tão antigas como a própria história, e, desde há muito, diversos modelos de administração e de integração coloniais têm sido experimentados. A África foi o último continente subjugado pela Europa. O que há de notável nesse período é, do ponto de vista europeu, a rapidez e a facilidade relativa com que, mediante um esforço coordenado, as nações ocidentais ocuparam e submeteram um continente assim tão vasto. É um fato sem precedentes na história.




O bom -senso faz -se necessário, portanto, para que se possa introduzir um pouco de ordem na confusão de teorias a que essa mutação capital da história africana deu origem. Essas teorias podem ser classificadas em: teoria económica, teorias psicológicas, teorias diplomáticas e teoria da dimensão africana.


Essa teoria conheceu vicissitudes de toda sorte. Quando o comunismo ainda não constituía ameaça ao sistema capitalista ocidental, ninguém punha realmente em dúvida a base económica da expansão imperialista. Não é, pois, casual o sucesso da crítica de Schumpeter à noção de imperialismo capitalista[5] entre especialistas não marxistas. Os repetidos ataques a essa teoria apresentam hoje resultados cada vez menos concludentes. Em consequência, a teoria do imperialismo económico, sob forma modificada, volta a encontrar aceitação. Que se deve entender por imperialismo económico? As origens teóricas da noção remontam a 1900, quando os social-democratas alemães colocaram na ordem do dia do congresso anual do seu partido, realizado naquele ano em Mainz, a Weltpolitik, ou seja, a política de expansão imperialista em escala mundial.


Preferimos analisar aqui em termos psicológicos as teorias que comummente se classificam como darwinismo social, cristianismo evangélico e atavismo social, porque seus adeptos acreditam na supremacia da “raça branca”.


O cristianismo evangélico, para o qual A origem das espécies era uma heresia diabólica, não tinha, por sua vez, o menor escrúpulo em aceitar as implicações racistas da obra. As conotações raciais do cristianismo evangélico eram moderadas, todavia, por uma boa dose de zelo humanitário e filantrópico sentimento muito disseminado entre os estadistas europeus durante a conquista da África.

Sustentava -se, assim, que a partilha da África se devia, em parte não desprezível, a um impulso “missionário”, em sentido lato, e humanitário, com o objectivo de “regenerar” os povos africanos[6]. Já se afirmou, além disso, que foram os missionários que prepararam o terreno para a conquista imperialista na África oriental e central, assim como em Madagáscar. No entanto, se é verdade que os missionários não se opuseram à conquista da África e que, em certas regiões, dela participaram activamente, esse factor, por si só, não se sustenta como uma teoria geral do imperialismo, em razão de seu carácter limitado.





Para estudar a resistência africana à colonização no sul do continente no século XIX, é importante compreender bem o ambiente cultural e social em que ela se verificou. As principais forças históricas eram o expansionismo colonial, a cristianização e o ensino dos missionários, a revolução Zulu e seus corolários: o Mfecane e as migrações dos Nguni. Na época da Conferência de Berlim sobre a África ocidental (1884 -1885), que se caracterizou por uma concorrência febril entre as nações europeias, ávidas de ampliar as possessões coloniais africanas, havia mais de 70 anos que os britânicos e afrikaners já disputavam os territórios da África meridional. Termos tais como “tratado”, “esfera de influência”, “ocupação efectiva”, “anexação” e “força de fronteira”, cujo uso se propagou a toda a África após aquela conferência, pertenciam a um vocabulário já corrente na África austral desde 1815.

Os colonos europeus do sul da África, ao contrário dos do resto do continente, projectavam, desde o início, fundar estabelecimentos permanentes nessa região nova que os atraía pelo clima temperado, pela fertilidade das terras aráveis, pela mão-de-obra barata e, enfim, pela riqueza mineral. Por volta de 1880, havia na África meridional quatro entidades políticas brancas: de um lado, a Colónia do Cabo e Natal, com maioria de população branca e de língua inglesa (respectivamente, 185 mil e 20 mil almas), e, de outro, a República Sul -Africana e o Estado Livre de Orange, que, juntos, contavam mais de 50 mil brancos de língua holandesa. Posteriormente, outra colónia inglesa foi fundada: Mashonalândia (12 de Setembro de 1890). Nessas cinco colónias de povoamento, a grande massa de autóctones africanos era dominada por minorias brancas.

Para as populações San e Khoi -khoi, a submissão remontava a mais de dois séculos; para outras, como os Xhosa, os Mfengu, os Tembu e os Mpondo, a dominação colonial, sob diferentes formas, perdurava havia quase cem anos. Nos termos da Convenção de Sand River (1852), britânicos e afrikaners tinham acordado não vender armas de fogo às populações autóctones da África meridional. O acordo privava os africanos de um meio de que necessitavam para sua autodefesa e para uma resistência eficaz.


A cristianização e o ensino levados a cabo pelos missionários também constituíram factores importantes da evolução e da natureza da resistência africana à conquista colonial. Os missionários tinham criado uma classe de pequenos burgueses africanos (catequistas, professores, jornalistas, homens de negócios, advogados e empregados de escritório), que reconheciam a pretensa inferioridade cultural dos africanos, aceitando a colonização branca como fato consumado, e que admiravam os brancos por seu poderio, riqueza e técnica. Podemos citar, entre os representantes de tal elite, Tiyo Soga (1829-1871).


Os factores a que aludimos influenciaram consideravelmente a natureza e a intensidade das reacções africanas diante do avanço da colonização e do imperialismo europeu. De modo geral, houve três tipos bem distintos de iniciativas e de reacções: a) o conflito armado, levado pelos Zulu, Ndebele, Changanana, Bemba, Yao e Nguni, assim como pelas chefias dos Mangwende, Makoni e Mutasa; b) o protectorado ou a tutela, escolhidos pelos Sotho, Swazi, Ngwato, Tswana e Lozi, que possuíam todos eles Estados independentes, não tributários, e procuraram a protecção dos britânicos contra os bóeres e os Zulu, Ndebele, Bemba e Nguni; c) alianças, pelas quais optaram numerosas comunidades pequenas e tributárias, vítimas de assaltos e que viviam refugiadas, como os Khoi -khoi, os Xhosa, os Mpondo, os Tembu, os Mfengu e os Hlubi na África do Sul, os Bisa, os Lungu, os Iwa e os Senga na Rodésia do Norte, e os Cewa, os Njanja, os Nkonde e os Tonga na Niassalândia, que esperavam assim obter “protecção, paz e segurança”. Havia rivalidades históricas entre reinos novos e expansionistas, bem como conflitos de interesses que opunham diferentes grupos culturais e dinastias dentro desses mesmos reinos.

Cada dirigente, cada sociedade e mesmo cada indivíduo reagia às crescentes usurpações dos europeus em função do contexto de relações e realidades inter-regionais existentes antes da chegada dos brancos. Os colonizadores europeus não deixaram de explorar essa situação. Estudaram os sistemas políticos da África daquela época, o que muitas vezes lhes permitiu prever as formas de reacção e de resistência africanas. Descobriram assim que o expansionismo dos Zulu, dos Ndebele, dos Yao e dos Nguni só podia funcionar sem choques se as aristocracias fossem poderosas, os chefes locais fracos e divididos, ou, pelo menos, se estes sentissem necessidade de protecção militar e confiassem na aristocracia dirigente para lhes assegurar tal protecção.


Há mais de vinte anos, os movimentos de resistência eram tidos simplesmente como impasses que a nada levaram. Na última década, porém, temse vigorosamente defendido que, por todos os ângulos, esses movimentos se voltavam para o futuro. Do ponto de vista da soberania, podese afirmar que eles anteciparam sua reconquista e o triunfo do nacionalismo africano. Na medida em que são depositários de ideologias proféticas, podese considerar que tenham contribuído para novos agrupamentos em torno de ideias. Alguns trouxeram consigo a melhora da situação dos povos revoltados. Outros instituíram lideranças alternativas às oficialmente reconhecidas.

Eu[7] próprio já afirmei que esses movimentos estavam “ligados” ao nacionalismo das massas por terem sido movimentos de mobilização de massas, levando em conta a continuidade da atmosfera e dos símbolos veiculados por outros movimentos de massa do período intermediário e, enfim, porque os movimentos nacionalistas manifestamente se inspiraram nas lembranças de um passado heróico.

Estes argumentos foram desenvolvidos por outros historiadores e, hoje em dia, o carácter precursor dos movimentos de resistência tornouse um axioma para os teóricos dos movimentos nacionalistas e das guerrilhas. Assim, na conclusão de seu estudo sobre a resistência ovimbundo aos portugueses, escreve Walter Rodney:

A resistência armada no planalto de Benguela reapareceu nos últimos anos. As circunstâncias em que se verificou este fenómeno e suas relações com épocas anteriores são questões tão fundamentais que não procuraremos darlhes resposta, pois esta seria forçosamente incompleta. Basta notar que os angolanos que lutam pela liberdade afirmam haver conexão entre suas guerras de libertação nacional e os movimentos de resistência anteriores e que [com sua autoridade] as massas populares relembram distintamente o espírito de tais acontecimentos, como a guerra dos Bailundo. Académicos estéreis não se encontram à vontade para refutar isto[8].



Para as mitologias rivais do imperialismo europeu e do nacionalismo colonial, mudança é uma inovação introduzida pela dominação europeia nas sociedades ditas “tradicionais”. Para os apologistas do imperialismo, aplicada aos povos coloniais a mudança sugere progresso, transição linear, brusca e benéfica de uma cultura tradicional estática e quase não -produtiva para um modernismo dinâmico e sem limites. Mas para os nacionalistas coloniais a palavra traz a conotação de “dilaceramento”, processo pelo qual imperialismos fechados a toda e qualquer simpatia, a toda e qualquer compreensão, transtornam um universo idílico para substituí-lo por tumulto, instabilidade e incerteza.

À parte essas divergências, os dois grupos parecem concordar a respeito de certo número de postulados relativos à mudança nas sociedades tradicionais sob domínio colonial. Esses postulados abrangem a crença de que essas sociedades são fundamentalmente estáticas e, portanto, desfasadas em relação aos valores modernos, de onde resulta que as relações naturais entre ambos só poderiam ser conflituavas; a crença de que valores, atitudes e estruturas novos abalam necessariamente seus equivalentes tradicionais ao primeiro contacto e de que, em todas as colónias e mesmo em todas as regiões geográficas, as sociedades tradicionais reagiram de maneira uniforme ao impacto da cultura europeia.

Foi, portanto, sem dificuldade que muitas instituições e ideias africanas autóctones sobreviveram ao choque com valores europeus a elas estranhos, quando não se fundiram a eles. Como exemplo, o caso dos Igbo, que é de regra considerar inteiramente ocidentalizados. Segundo Sylvia Leith-Ross, nos anos 30 tanto praticavam a comunhão como a magia e a medicina tradicionais, com desconcertante facilidade: “No jardim que cerca a sua nova casa com teto de laje, plantam lado a lado o hibisco da ‘civilização’ e o ogirisi, árvore dos ritos pagãos familiares.


Há que apreender claramente a natureza do nacionalismo na África para apreciar de modo correcto os acontecimentos examinados nesta parte do nosso trabalho. Cumpre, inicialmente, distinguir o nacionalismo europeu do século XIX e aquele que a África colonizada experimentou entre as duas guerras mundiais. Na Europa, o nacionalismo representou, para as comunidades que aceitavam a realidade de identidades culturais e de um passado histórico comuns, a aspiração a uma existência soberana dentro de organizações políticas (Estados) próprias.

A luta tinha como objectivo garantir a coincidência entre a nação cultural e a organização de sua vida política como Estado. Conforme demonstram os exemplos gregos, italiano e alemão, o resultado definitivo dos movimentos nacionalistas foi a criação de Estados Nacionais. Na África, as aspirações dos Estados e dos grupos que, até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, combateram contra as potências imperialistas europeias e se esforçaram para impedir o estabelecimento do sistema colonial eram essencialmente as mesmas que animavam os movimentos nacionalistas europeus. No entanto, um dos efeitos da guerra foi consolidar as posições das potências imperialistas frente aos defensores da independência e da soberania africanas. Apesar da fermentação das ideias que contribuíram para minar o sistema imperialista, a dominação colonial tornou -se uma situação de fato, a ponto de certos autores considerarem o período entre as duas guerras como a “idade de ouro” do colonialismo na África.

 A maior parte das colónias criadas abrigava grupos nacionais culturais e historicamente diferentes, cuja unidade derivava principalmente do fato de estarem igualmente submetidas a um senhor estrangeiro. A situação colonial representava para todos um quadro novo, onde havia que forjar identidades novas que os sustentassem na luta contra as atrocidades da dominação estrangeira. As fronteiras coloniais que, no mais das vezes, englobavam diversas nações culturais sob uma administração imperial comum foram aceitas tais como eram.

A constituição da nova identidade consistia, de início, em aceitar a africanidade essencial das diversas nações culturais. Os territórios das administrações coloniais passaram a constituir, em praticamente todos os casos, a definição territorial daquilo que os africanos começaram a considerar como protestados, em torno dos quais procuravam desenvolver na população um sentimento de pertença com um.


Em 1935, o colonialismo sufocava a África com seu torniquete. Parecia ter vindo para ficar para sempre. No entanto, revelou-se tão efémero como todos os empreendimentos baseados na força. No espaço de cerca de quarenta e cinco anos, a partir daquele ano, mais de 90% do território africano havia se libertado do colonialismo, que se mantinha somente ao sul do Limpopo. Na verdade, o colonialismo perdurou em toda a África pouco menos de cem anos: desde a década de 1880 até a de 1960. Na história de um povo e de um continente, esse período é mais do que breve.


Talvez não haja tema tão controverso como o da influência do colonialismo sobre a África. Para alguns africanistas como L. H. Gann, Peter Duignan, Margery Perham e P. C. Lloyd, de modo geral sua influência foi benéfica e, na pior das hipóteses, não prejudicial para a África.

Lloyd, por exemplo, não hesita em afirmar o carácter positivo da influência colonial:

É fácil questionar hoje a lentidão do desenvolvimento económico durante os cinquenta anos de dominação colonial. Não obstante, a diferença entre a condição da sociedade africana do final do século XIX e a do final da Segunda Guerra Mundial é espantosa. As potências coloniais proporcionaram toda a infra-estrutura da qual dependeu o progresso na época da independência: aparelho administrativo, aliás eficiente, que alcançava as aldeias mais remotas, uma rede de estradas, de ferrovias e de serviços básicos em matéria de saúde e de educação. As exportações de matériasprimas trouxeram considerável riqueza aos povos da África ocidental[9].

Em suas conferências de Reith, Margery Perham também afirmou que

os críticos do colonialismo estão principalmente interessados no presente e no futuro imediatos, mas há que lembrar que nosso império em vias de extinção deixou atrás de si uma vasta herança histórica, carregada de legados positivos, negativos e neutros. Nem nós nem eles deveríamos omitir esta verdade[10].

É interessante notar que D. K. Fieldhouse, outro historiador inglês, chegou à mesma conclusão ,em uma obra recentíssima (1981):

Parece então que o colonialismo não merece os elogios nem as maldições que comummente lhe lançam, pois que, se fez relativamente pouco para superar as causas da pobreza nas colónias, não foi ele quem criou essa pobreza. O império teve importantíssimos efeitos económicos, alguns bons, outros maus [...][11].


O impacto no terreno político foi, portanto, importante, mesmo que sua positividade esteja longe de ser total. De igual importância, e até maior, foi a herança económica. O primeiro efeito positivo do colonialismo – o mais evidente e o mais profundo – foi a constituição de uma infra-estrutura de estradas e vias-férreas, a instalação do telégrafo, do telefone e, às vezes, de aeroportos. Nada disso existia evidentemente na África précolonial, onde, como disse J. C. Caldwell, “quase todos os transportes terrestres – até a era colonial – se faziam às costas dos homens”.

Essa infra-estrutura de base foi terminada na África por volta da década de 1930 e, depois disso, poucos quilómetros de ferrovias foram acrescentados. Sua importância ia além do interesse puramente económico, já que facilitava o movimento não só de mercadorias, de culturas de exportação e de tropas, mas também de pessoas – o que contribuiu para reduzir o “espírito paroquiano”, o regionalismo e o etnocentrismo.

O impacto do colonialismo sobre o sector primário da economia foi igualmente significativo e importante. O colonialismo tratou por todas as formas de desenvolver e de explorar alguns dos ricos recursos naturais do continente – e, nesse plano, obteve êxitos importantes. Foi durante o período colonial que todo o potencial mineral da África foi descoberto, a indústria mineira teve enorme expansão e as safras de exportação – cacau, café, tabaco, amendoim, sisal, borracha etc. – se disseminaram. Foi durante esse período que a Costa do Ouro se tornou o primeiro produtor mundial de cacau, enquanto em 1950 as culturas de exportação representavam 50% do produto interno bruto da África Ocidental Francesa.

Há que salientar, como M. H. Y. Kaniki o fez antes, que na África ocidental essas culturas foram desenvolvidas pelos próprios africanos, o que mostra claramente seu desejo e capacidade de adaptação e resposta favoráveis aos estímulos positivos. Conforme demonstrou J. Forbes Munro, a maior parte dessas mudanças económicas fundamentais manifestouse durante vinte anos, de meados dos anos 1890 a 1914, época em que “as infra-estruturas da maior parte das economias nacionais contemporâneas foram criadas pelas autoridades coloniais” e em que “o comércio entre a África e o resto do mundo se desenvolveu a um ritmo sem precedente histórico”[12].

Essa revolução económica teve consequências de grande alcance. A primeira foi a comercialização da terra, o que a transformou em valor real. Antes da era colonial, é incontestável que enormes extensões de terra, em muitas partes da África, estavam subpovoadas e sub-exploradas.

A introdução e a difusão das culturas de exportação, bem como o desenvolvimento das indústrias mineiras, puseram termo a tal situação. De fato, o ritmo de desmatamento das florestas virgens foi tal que as autoridades coloniais se viram obrigadas a constituir reservas um pouco por toda a parte da África para deter sua exploração. Em segundo lugar, a revolução económica provocou o aumento do poder aquisitivo de alguns africanos e, portanto, da procura de bens de consumo. Em terceiro lugar, o fato de os próprios africanos cultivarem safras exportáveis permitiu que as pessoas enriquecessem, fosse qual fosse sua posição social, principalmente nas regiões rurais.








Falar sobre a África na era do Tráfico de escravos ou colonial, é abordar sobre um tema amplo que cresce a cada dia, a fonte usada para realização deste trabalho, por exemplo, tem mais de 1022 páginas, todas elas falando, unanimemente, do passado da África, esperamos, deste modo, que o breve resumo apresentado neste estudo tenha nos ajudado a entender toda a dinâmica do processo de escravização e do tráfico de escravos, bem como retratado essa época, responsável pela diáspora dos negros africanos.

O objectivo da pesquisa que se caracterizou pela análise histórica da África na era do Tráfico de escravos, resultou em novos e significativos conhecimentos sobre a temática, e, acreditamos que o mesmo possa contribuir para o aprimoramento do trabalho docente.

Por fim, desejamos que esta pesquisa, proporcione novos questionamentos a serem analisados futuramente, contribuindo dessa maneira, para o estabelecimento de uma relação étnico­racial mais harmoniosa, na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.







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RODNEY, W. s.d. 1971. “Resistance and accommodation in Ovimbundu/Portuguese relations”. Seminário. Department of History, University of Dar-es-Salaam.



NOTAS DE RODAPÉ

[1] ABBAS, 1931, p. 9, apud BERQUE.
[2] Apud FYNN, 1971, p. 434.
[3] Apud CROWDER, 1968, p. 97.
[4] DAVIDSON, A. B., 1968, p. 177 88, e CROWDER, 1968, p. 179.
[5] SCHUMPETER, 1955.
[6] GALBRAITH, 1961, p. 3448; BENNETT, ed., 1953; GROVES, 1969, para o factor missionário na expansão imperialista.
[7] OGOT, 1974a.
[8] RODNEY, 1971b, p. 9.
[9] LLOYD, 1972, p. 80 1.
[10] PERHAM, 1961, p. 24.
[11] FIELDHOUSE, 1981, p. 105.
[12] MUNRO, 1976, p. 86.

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