terça-feira, 16 de junho de 2015

A ORIGEM DO TRÁFICO DE ESCRAVOS EM ÁFRICA - elaborado por Vieira Miguel Manuel


A ORIGEM DO TRÁFICO DE ESCRAVOS EM ÁFRICA




SUMÁRIO


3.      BIBLIOGRAFIA.. 11



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No presente trabalho vamos falar acerca da Origem do Tráfico de Escravos em África, veremos a origem e formação social, bem como os diferentes tipos de escravidão e por fim, a escravidão no contexto africano que é objectivo da nossa pesquisa.

Para começar é importante dizermos que o estudo do processo de escravização dos povos africanos é essencial para que se compreenda a situação actual de desigualdade no planeta. Revela uma longa história de exploração e subjugação de populações fragilizadas por outras, mais equipadas. Demonstra também que a desestruturação econômica e cultural tem efeitos desastrosos de longa duração. Pois, do ponto de vista econômico, a escravidão foi uma forma eficiente de acumulação primitiva. No que diz respeito às pessoas, foi uma violência irreparável, que pressupõe, dentre outros fatores, a existência de povos muito pobres, mão-de-obra excedente que possa ser explorada em benefício de uma minoria. Assim, parte do atual contexto socioeconômico da África de miséria e exclusão é consequência de fatos passados.






A escravidão como fenômeno histórico, disperso mundialmente, esteve presente na história da humanidade, desde a fase final do Neolítico, até períodos mais recentes. Fato aceito amplamente pelas diversas pesquisas realizadas. Porém, há muita dificuldade em se obter um consenso quanto à origem da escravidão, produzindo variadas hipóteses. Ao analisar essa questão Silva (2003), descreve a tese de Karl Jacoby, em que este argumenta que, o processo de domesticação de animais, teria servido de modelo para a escravização de seres humanos. Destacando que o surgimento da agricultura teria gerado a necessidade de mão-de-obra, obtida através dos prisioneiros de guerra, sendo aplicadas as mesmas formas de controlo às da domesticação de animais.

Discordando desta tese, Silva (2003), propõe o inverso, que primeiro homem escravizou o outro e depois domesticou os animais, argumentando que a experiência obtida na escravização teria sido aplicada na domesticação. Sem, contudo recusar a hipótese, de que esses dois processos, possam ter ocorrido conjuntamente, em algumas culturas. Como exemplo cita, os povos da América e povos antigos da África subsaariana.

Descreve que, assim como teria ocorrido com os animais, que ao se aproximar dos homens, para comer os restolhos de alimentos, acabou acomodando-se a eles. Processo semelhante teria ocorrido com os sobreviventes de guerras, ficando sem amparo, sem ter aonde ir, muitas vezes, juntavam-se ao grupo vencedor, reduzidos ao estado servil.

Destaca ainda que, provavelmente na África, assim como ocorrera na Mesopotâmia e em outras partes do mundo, considerou-se mais conveniente não matar mulheres e crianças dos vencidos. Pois os mesmos poderiam substituir os braços perdidos nas guerras, aumentando dessa forma o grupo e sua força de trabalho, podendo ainda tomar lugar de um membro de linhagem no túmulo de chefes mortos, nos sacrifícios aos deuses e antepassados ou ainda nos ritos da chuva e da fertilidade.

A relação que se estabelecia, entre o escravo e seu senhor era de violência, desde sua origem até o momento que se revelaria quem ia ser escravo em sua identidade social. Nesse momento, que o escravo se tornava socialmente morto, sendo arrancado de seu meio, transferido para outro lugar, longe, com outros costumes, outra fé e outro idioma. (SILVA, 2003)

“Tratava-se, no entanto de um ser humano diferente, um estrangeiro por natureza, concebido muitas vezes como distinto e inferior, desenraizado e só de modo lento, e quase sempre de maneira incompleta, inserido noutro conjunto social. A esse estrangeiro absoluto, busca a comunidade dominante aviltar, despersonalizar, infantilizar e despir de todas as relações grupais. E é o fato de ser um estranho, que perde a família, a vizinhança, os amigos, a pátria e a língua, e a quem se nega um passado e um futuro, o que permite a redução de pessoa a algo que possa ser possuído”. (SILVA, 2003, p. 86)

Para o escravo, destituído de sua liberdade, introduzido em outra sociedade, para que fosse reduzido à condição de estrangeiro, pois era etnicamente diferente, era a maneira de negar-lhe direitos e privilégios existentes naquela sociedade, que diante deste contexto poderia explorá-lo. (LOVEJOY, 2002)

A onipresença de estruturas escravistas entre os diversos povos do mundo se justificaria pela repugnância do homem ao trabalho, tida como atividade constrangedora, que este executa a contragosto, compelido pelas circunstâncias ou pela coerção. A chave para a felicidade seria a ociosidade prazerosa, por isso, para obrigar o outro a executar o trabalho que lhe coubera, um grupo com predominância política e social, usa de violência, para subjugar uma parcela da população.“A fonte de tiranias políticas em todas as suas formas, da exploração, em todos os seus contextos, e das opressões sob todas as máscaras, encontra-se nessa realidade”. (WEDDERBURN, 2007, p. 162)


O termo escravidão apresenta diversas definições, Silva (2003) a descreve como:

·         Instituição social que consiste no direito de propriedade sobre seres humanos e na utilização de seus serviços;
·         Domínio permanente e violento sobre pessoas alienadas de seu nascimento e geralmente desonradas;
·         Vínculo de poder e domínio originado e sustentado pela violência no qual a “morte social” substitui à morte física do prisioneiro de guerra, do condenado à pena capital ou do indigente ou enjeitado.

Lovejoy (2002) define escravidão como uma forma de exploração com características específicas, destacando a ideia de que o escravo era uma propriedade, um estrangeiro, alienado de sua origem ou do qual por sanções judiciais ou outras se retirava à herança social que lhe coubera ao nascer; que a coerção podia ser usada à vontade, que sua força de trabalho estava à completa disposição de seu senhor, que não tinha direito a sua própria sexualidade, e, por extensão às suas próprias capacidades reprodutivas, sendo sua condição hereditária.

Wedderburn (p. 162-163, 2007) descreve a escravidão como:

“A mais primitiva forma de coerção destinada a extorquir de um ser humano a sua força de trabalho em proveito de outro que se dispensa da mesma obrigação. Trata-se da primeira e mais primitiva das formas de esmagamento do homem pelo homem, de extorsão da força de trabalho do semelhante, e do confisco de sua dignidade humana.”


Muito embora não exista um consenso em definir e catalogar as diversas formas de escravidão que existiram pelo mundo inteiro, Wedderburn (2007) distingue pelo menos três grandes categorias:

·         Escravidão doméstico-serviçal, geralmente baseada nas estruturas de família, abrangendo número limitado de pessoas na sociedade. Presente na Ásia antiga e “medieval” (China, Japão, Coréia, Índia, Indonésia); no Oriente Médio semita pré-islâmico; na América pré-colonial (Olmeca, Inca, Maia, Asteca) e na África.
·         Escravidão econômica generalizada, surgida historicamente no Mediterrâneo europeu com a civilização greco-romana, perdurando até o século XV. Nessa estrutura de escravatura, “toda a sociedade livre” que repousa sobre o trabalho de uma classe de escravos, violentamente reprimida, vigiada, considerada jurídica e moralmente como ‘coisa’.
·         Escravidão-racial de plantation, surgida pela primeira vez no Oriente Médio a partir do século IX, desenvolvida do século XV até o final do século XIX, em todo o continente americano. Apesar de ser muito parecida com a escravidão econômica generalizada, apresenta uma diferença importante e substancial onde o estatuto de escravo é reservado exclusivamente a uma raça alvo – a negra.

Esta ultima categoria, de acordo com Wedderburn (2007), parece ter surgido da fusão da escravidão econômica generalizada com a visão raciológica surgida no mundo árabe, há treze séculos. De acordo com essa teoria racista, os povos de pele negra, eram vistos como seres inferiores nascidos para serem escravos das supostas raças superiores de pele branca.


Estudos revelam que a existência da escravidão na África remonta a antiguidade do Egito, destacando que, desde a I Dinastia, havia escravos negros, provenientes de regiões como Núbia, Cordofã e Darfur. (SILVA, 2003) No Egito faraônico, os escravos eram denominados de “mortos vivos”, sendo propriedade do faraó, este poderia reparti-los entre os deuses, o clero e a nobreza. Embora possa ter variado em diferentes épocas, acredita-se que o número de escravos tenha sido limitado, pois a mão-de-obra mais utilizada era composta pelos “felás”.

“A escravidão pauta-se por diversas relações de dominação e subordinação do outro, tornando-o servil, escravizando-o de várias maneiras. A que submeteu os africanos no século XV tem diferenças flagrantes em relação àquela que existia anteriormente na Europa e àquela que geralmente se menciona quando se trata da África anterior à conquista europeia.” (MEILLASSOUX, 1995).

Ao deparar-se com pesquisas sobre a escravidão na África, Silva (p.80, 2003), descreve:“[...] teria sido a escravidão reinventada na África – e mais de uma vez, e em mais de um lugar, e com desenhos distintos. Ignoramos, porém, quando, como e onde. E as histórias de seu desenvolvimento.”

Para análise desse fenômeno, é importante ter em mente, que, o processo de escravização variava, de região para região, de cultura para cultura e de grupo para grupo. Sendo necessário observar, dentro do contexto histórico, as características próprias que apresentavam as diversas sociedades, em suas complexas organizações social, cultural e política.

Outro aspecto significativo para análise da escravidão na África, é entender a intrínseca relação entre a escravidão e a questão da terra. A abundância de terras e a pouca disponibilidade de instrumentos para trabalhála, formava um conjunto que transformava a mão-de-obra em uma questão essencial. Assim, a riqueza de uma pessoa era determinada pela quantidade de braços que tinha a sua disposição para a produção. (SILVA, 2003)

Era a posse do trabalho – do trabalho familiar e do escravo – o que garantia a reprodução e a expansão das riquezas. Sendo os escravos o meio mais fácil e rápido de aumentar o volume de mão-de-obra, a obtenção deles tornou-se a principal, se não
a única via para apressar o enriquecimento de um chefe de família, de linhagem ou de aldeia e singularizá-lo entre os seus pares. E também para fortalecê-lo politicamente. Pois poderoso era aquele que tinha sob suas ordens grande cópia de gente em armas. (SILVA, 2003, p. 90)

Na quase totalidade das sociedades africanas, era rico e poderoso quem possuísse muitas mulheres e escravos. A terra, tinha-se tradicionalmente como um bem grupal, com características próprias. Como descreve Silva.[1]

Embora o processo de valorização da terra fosse diferente, ela não era destituída de valor. Tanto assim que, o direito de ceder o seu uso estava nas mãos de quem estava no poder: rei, chefe, cabeça de linhagem. O que transformava o uso desse controle em uma maneira de manter e ampliar o poder de mando. (SILVA, 2003)

Na África, a diversidade social que surgira a partir do Neolítico, abrigava povos pastoris (nômades ou sedentários), povos agricultores, convivendo no mesmo espaço com grupos organizados em Estados burocráticos potentes, agremiações étnicas, clâmicas ou confederações tribais. (WEDDERBURN, 2007)

As pequenas sociedades baseadas na etnia e no parentesco são aceitas como as mais antigas estruturas sociais africanas. Nestas sociedades, são antigas as referências sobre distinções de padrões patrilineares e matrilineares. Caracterizadas por um modo de produção denominado de linhagem ou doméstico, apresentavam distinções etárias e sexuais. Nelas, o poder político, era baseado na “gerontocracia”- os mais velhos controlavam os meios de produção e reprodução, tidos como essenciais para manutenção da sociedade. O forte controle exercido sobre as mulheres, explica a dependência à sua fertilidade e ao seu trabalho, pois constituíram, em muitas vezes, a principal mão-de-obra nas atividades agrícolas. (LOVEJOY, 2002)

Segundo Lovejoy (2002), a escravidão, nessas sociedades, não era uma instituição essencial, pois a base de sua formação social, não se alterava. A escravização, era vista como um dos muitos tipos de relações de dependência, tornando-se um meio eficaz para aumentar o número de pessoas que desempenhavam as mesmas funções, de controlar aqueles que não tinham ligações de parentesco e para aumentar o poder individual ou do grupo.

Junto a essa categoria, existiam outras formas de dependência, como a do penhor, onde a pessoa era retirada de seu grupo, como garantia de uma dívida; a categoria etária – os jovens, que não tinham permissão de participar ativamente das decisões de linhagem; também eram considerados instituições de dependência, o casamento e o concubinato. Havia ainda, os dependentes mobilizados de acordo com o interesse do grupo de linhagem, utilizados no campo, para caça, na defesa de cidades ou em cerimônias religiosas. (LOVEJOY, 2002)

O processo de assimilação a uma linhagem, descrito no século XIX, como processo integrativo, constitui-se em uma questão polêmica entre pesquisadores sobre o assunto. Segundo Silva (p. 82, 2003), embora estudiosos denominados de absorcionistas,”negassem que se pudesse falar em escravidão na África, a não ser entre aspas”, defendendo a tese de que o processo integrativo levava a uma reumanização do escravizado, ao ser incorporado ao novo grupo social, reduzindo progressivamente a sua marginalização. Entretanto, ele argumenta que esse processo, em nada melhoraria a vida daquele que retirado a força de seu grupo, era reduzida a condição de estrangeiro em outro.

Concluindo essa questão, Silva (2003) destaca que em boa parte das sociedades africanas, esse processo assimilativo, não era completo, apresentando diferenças notáveis. Mas, lembra que este foi mudando ao longo do tempo, acompanhando as alterações nas estruturas econômicas e de poder. Ao abordar essa forma de escravidão, não devemos ter uma visão romantizada da mesma. Muitos pesquisadores, ao compará-la com outros regimes escravocratas, a têm qualificada como branda ou benévola. Argumento utilizado pelos abolicionistas do século XIX, na tentativa de diferenciar o escravismo do Novo Mundo, daquele descrito na Bíblia ou na África. Não podemos dissimular a dura realidade. (SILVA, 2003)

Na maioria dos casos, ter sido escravo deixava uma marca indelével, uma marca que se transmitia de geração em geração, como se fosse a sua principal herança. Esse legado continua até hoje a afligir os descendentes de escravos entre vários povos africanos, que os discriminam ou tratam com reserva ou desprezo. (SILVA, 2003, p.84)


Na colônia de Angola, a exportação de mão-de-obra escrava pelo porto de Luanda terá sido alvo de competição no século XVII entre portugueses e holandeses. É depois da disputa entre os colonizadores, cujo vencedor foi o reino de Portugal, que pode ter se originado a captura direta de escravos, nas chamadas Guerras Angolanas, no seio de certas tribos que tinham lutado contra os portugueses. Foi dessa forma que Angola se tornou um centro importante de fornecimento de mão de obra escrava para o Brasil, onde crescia não apenas a produção de cana-de-açúcar no Nordeste, mas também a exploração de ouro na região central. Navios com mercadorias de Goa faziam escala em Luanda lá deixando panos, as chamadas "fazendas de negros". Dali, seguiam para Salvador, na Bahia, carregados de escravos e de outras mercadorias provenientes da Índia (como louças e tecidos). Foi assim que Salvador se tornou um centro difusor de mercadorias da Índia pela América do Sul.

Os negócios foram se estruturando aos poucos. Num primeiro momento, os governadores da colônia detinham o poder de determinar o preço dos escravos. O pagamento era feito em ouro proveniente de Minas Gerais, no Brasil. Mais tarde, em 1715 a coroa portuguesa proibiu que os governadores se envolvessem com o tráfico. Negociantes provenientes do Brasil (principalmente do Rio de Janeiro, da Bahia e também de Pernambuco) assumiram as rédeas do comércio, que se aqueceu. A principal feira fornecedora de escravos para o porto de Luanda era a feira de Kassanje. No século XVIII, a cachaça brasileira (geribita) passou a ter papel de destaque nas trocas, sendo valorizado tanto em Angola quanto no Brasil. Figurava, ao lado da seda chinesa e as armas europeias, como uma das principais moedas de troca. Era, na verdade, a moeda mais corrente, já que o comércio de armas era controlado e a seda chinesa a só chegava à África depois de passar por Lisboa, o que elevava seu preço e reduzia sua liquidez. Outro produto brasileiro valorizado na África era o fumo de corda de Salvador.


A partir da abertura da costa Atlântica da África, pelos comerciantes europeus, ocorre um vertiginoso crescimento e expansão do tráfico de escravos, com consequências decisivas na evolução da escravidão e na economia dessa região[2]. A similaridade nos padrões comerciais do tráfico de escravos, entre portugueses e muçulmanos, fica evidente quando analisamos as seguintes características: demanda de escravos domésticos para a Europa meridional, demanda de escravos para atender plantações de cana-de-açúcar nas ilhas do Mediterrâneo e depois do Atlântico, pelo desenvolvimento do comércio de escravos ao longo da costa ocidental africana e pelas mercadorias exportadas para a África Ocidental. (LOVEJOY, 2002)

O desenvolvimento e expansão do comércio transatlântico iniciado na última metade do século XV representou um importante ponto de partida na história do tráfico de escravos. Em decorrência desse comércio, a escravidão existente nesta região, passou por transformações distintas daquelas produzidas nas regiões islamizadas. Embora ela tenha continuado, na maioria dos lugares, a ser interpretada no contexto das estruturas de linhagem – como escravidão de linhagem, ela se consolida como importante instituição nas estruturas das sociedades locais. Essa relação entre o comércio escravo europeu e o desenvolvimento da escravidão nas sociedades africanas, ajuda a esclarecer essa mudança histórica. A presença constante de comerciantes nesta região incentivou a formação de um comércio sistemático de coleta de escravos, que passava a ser direcionado não só para os grupos de parentesco, mas também para o mercado exportador. A consequência dessa relação foi a perda pela África desses escravos e a substituição de seres humanos por mercadorias importadas. (LOVEJOY, 2002)

Como uma instituição, a escravidão de linhagem, apresentava aspectos semelhantes a todos os tipos de escravidão: elemento de propriedade, a identidade estrangeira, o papel da violência e a exploração produtiva sexual. Porém uma diferença notável era a ausência no campo ideológico, da influência de atitudes europeias. Esta ocorreu mais no campo econômico. Ideologicamente, as teorias e práticas adotadas, seguiam o padrão islâmico. A escravidão continuou a ser compreendida como de parentesco, mesmo quando escravos realizavam novas e variadas tarefas, semelhante ao padrão islâmico.

Semelhante também era o controlo exercido sobre as mulheres. Como a poligamia era permitida, mas não contava com nenhuma regulamentação, na prática ocasionava uma distribuição desigual das mulheres dentro da sociedade, o que permitia o controlo da produção e reprodução. Esse aspecto foi significativo no comércio de exportação, possibilitando uma divisão natural da população escrava. A demanda interna africana era por mulheres e crianças, enquanto para o comércio europeu, homens era a maioria. (LOVEJOY, 2002)

O crescimento do tráfico transatlântico expôs a África Centro-Ocidental a uma influência essencialmente nova. Povos ao longo da costa Atlântica experimentaram mudanças fundamentais em sua organização social, reorientando a escravidão para padrões bem diferentes do que existia anteriormente, acompanhado de um aumento interno na utilização de escravos. (LOVEJOY, 2002)

De acordo com Lovejoy (2002) o abastecimento desse intenso tráfico, para as Américas, foi realizado principalmente pelas regiões: área de Angola e do Congo (até quase o final do século XIX); Costa dos Escravos (Golfo de Benin, do final do século XVII até Século XIX); Costa do Ouro (do início do século XVIII até o seu final); baía de Biafra (centralizado no delta do Níger e do rio Cross). Outras regiões tiveram menor participação em épocas diversas como: do rio Bandana; costa perto do planalto de Futa Jalom; portos próximos onde agora ficam Morávia e Freetown; e a região da Senegâmbia com conexão com o interior muçulmano.

O crescimento desse tráfico, não poderia ter ocorrido sem um aumento simultâneo da capacidade de escravizar pessoas e da intensificação da violência. Essa situação era resolvida pela separação da infraestrutura comercial, que permitia a movimentação de escravos dentro e fora da África; e das instituições de escravização, que estavam associadas à fragmentação política. Assim, o mercado escravo e a escravização institucionalizada, formavam o cenário para a expansão da escravidão na África. No princípio do século XIX, o tráfico de escravos, tinha adquirido proporções gigantescas. O que levou a ser visto como a primeira das modernas migrações mundiais com características específicas por ser baseada na escravidão e possuir uma complexa organização. (LOVEJOY, 2002)

Mesmo aceitando que a escravidão existia na África antes da difusão do islamismo, é inegável que se constituía em um aspecto marginal as estruturas sociais. O que leva a afirmar que, a influência do islamismo e do comércio europeu interagindo com o ambiente nativo, afetaram a dinâmica da escravidão, provocando o surgimento de sociedades escravocratas, o que equivale dizer que a escravidão transformou-se em uma instituição fundamental. (LOVEJOY, 2002)



Ao concluir esta pesquisa sobre a origem do tráfico de escravos em África, foi possível verificar a importância do mesmo, para entender toda a dinâmica do processo de escravização e do tráfico de escravos, responsável pela diáspora dos negros africanos.

O objetivo da pesquisa que se caracterizou pela análise da escravidão no continente africano, resultou em novos e significativos conhecimentos sobre a temática, e, espera-se que o mesmo possa contribuir para o aprimoramento do trabalho docente.

Ao final, espera-se que esta pesquisa, proporcione novos questionamentos, a serem analisados, contribuindo dessa maneira, para o estabelecimento de uma relação étnico-racial mais harmoniosa, na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.






BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília, 2005.

DIAS, Jill R. - O Kabuku Kambilu (c.1850-1900): uma identidade política ambígua, Actas do Seminário Encontro de Povos e Culturas em Angola, Lisboa, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1997, pp 13–53.

História Geral da África - Volume V: África do século XVI ao XVII

LOVEJOY, Paul E. A Escravidão na África. Uma história e suas transformações, tradução Regina Bhering e Luiz Guilherme Chaves, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2002

LOVEJOY, Paul E. A escravidão na África: Uma história de suas transformações. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

SILVA, Alberto da Costa – Os estudos de história da África e sua importância para o Brasil, A dimensão atlântica da África, II Reunião Internacional de História da África, São Paulo, CEA-USP/SDG-Marinha/CAPES, 1997, pp 203–219.

SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o libambo. A escravidão na África de 1500 a 1700. Rio de Janeiro: Nova Fronteira/Ed. UFRJ, 2003.

SOUZA, Francisco Félix de. Mercador de Escravos, Rio de Janeiro, Nova Fronteira: EdUERJ, 2004

WEDDERBURN, Carlos Moore. O racismo através da história. Da antiguidade à modernidade. Copyright, 2007.










[1] Não era tida apenas como fator de produção e para uso dos contemporâneos; era a guardiã dos mortos, a servidora dos vivos e a promessa dos vindouros. Pertencia a todos eles, sendo teoricamente alocada a quem dela precisasse, pela família, a linhagem, o clã, a aldeia, a tribo ou o rei. Não tinha valor econômico próprio, mas do trabalho que nela se punha. Enquanto na Europa a propriedade de terra era a precondição para que se tornasse produtivo o uso de escravos – e de servos, e de assalariados -, na África passava-se o contrário: só tinha acesso a grandes tratos de solo que dispusesse de gente para cultivá-la. (Silva p. 99, 2003)
[2] As primeiras caravelas portuguesas se aproximaram da costa da África no Atlântico nas décadas de 1430 e 1440, alcançando o rio Senegal em 1445. Ao fazê-lo, abriram uma rota paralela às transarianas. Os portugueses estavam mais interessados em ouro e escravos, embora tivessem dispostos a comercializar pimenta, marfim e outros produtos. O seu investimento na exploração da costa africana era um esforço consciente para evitar os intermediários muçulmanos; inicialmente eles apenas tiveram sucesso em expandir o comércio transariano já existente, abrindo a rota marítima; depois, eles participaram no comércio interno africano como intermediários. Estruturalmente, por conseguinte, tanto os comerciantes portugueses quanto os muçulmanos exerciam as mesmas funções: eles conectavam a África subsaariana com o mundo mediterrâneo e participavam no comércio regional da África Ocidental. (LOVEJOY, 2002, p. 74)

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