ÍNDICE
Transtornos
do humor são aqueles nos quais o sintoma central é a alteração do humor ou do
afecto. Afecta diversas áreas da vida do indivíduo (profissional, familiar,
social...) e a maioria dos outros sintomas são menos prejudiciais ou
consequência do humor alterado. Tendem a ser recorrentes e a ocorrência dos
episódios individuais pode frequentemente estar relacionada com situações ou
fatos stressantes.
Não
se classifica como transtorno do humor quando a alteração de humor seja causada
por outra doença ou por medicamentos. Nesse caso, ela será apenas um sintoma.
É uma doença que se caracteriza pela alternância de
humor: ora ocorrem episódios de euforia (mania), ora de depressão, com períodos
intercalados de normalidade. Com o passar dos anos os episódios repetem-se com
intervalos menores, havendo variações e existindo até casos em que a pessoa tem
apenas um episódio de mania ou depressão durante a vida. Apesar de o Transtorno
Bipolar do Humor nem sempre ser facilmente identificado, existem evidências de
que factores genéticos possam influenciar o aparecimento da doença.
Muitas vezes o paciente não percebe que tem esta
enfermidade, e é necessário que familiares e amigos estejam bem informados, e
saibam reconhecer alguns dos seus sintomas para poderem encaminhá-lo a um
tratamento adequado A pessoa com Transtorno Bipolar do Humor pode apresentar
grandes oscilações no seu estado de humor, atrapalhando muito o andamento de
sua vida no trabalho, nas relações afectivas e familiares.
(Ou mania) É um estado de exaltação do humor, com aumento
de energia, sem qualquer relação com o momento que o indivíduo está vivendo.
Nesse período do transtorno bipolar, o paciente não está deprimido nem alegre
por motivo especial, mas apresenta humor eufórico ou irritável. Em geral, a
mudança do comportamento na euforia é súbita, mas o indivíduo não percebe sua
alteração ou a atribui a algum factor do momento. O senso crítico e a
capacidade de avaliação objectiva das situações ficam prejudicados ou ausentes.
Este texto foi produzido pelos pacientes da ABRATA sob
supervisão do Conselho Científico.
A depressão apresenta causas multifatoriais, tendo sua
origem em factores endógenos (neurobiológicos, genéticos) e factores exógenos
(psicossociais). Vale ressaltar que esses factores apresentam uma forte relação
de interdependência
Em prontuários hospitalares a frequência de pacientes
diagnosticados com algum transtornos do humor está entre 20% a 60% sendo o mais
comum depressão moderada ou grave. O número de casos na população de um local
depende das características sociodemográficas, do tipo e gravidade das
enfermidade associadas, dos critérios e definições usados na investigação. Transtornos
do humor frequentemente estão associado com outras doenças. Entre pacientes com
dor crônica 30% a 54% possuem os critérios para depressão maior. Entre os com
distúrbio na tireoide esse índice chega a 17%. Em pacientes com diabetes entre
11% e 31% desenvolvem depressão. . Após infarto agudo do miocárdio varia entre
17% e 27%. Entre pacientes participantes de programas de diálise em doença
renal terminal a prevalência da depressão chega a 25%. E entre os idosos que
tiveram Acidente Vascular Cerebral (AVC) chega a 15%. Em doenças neurológicas
como Alzheimer e Parkinson os sintomas de depressão maior podem ser identificados
em até metade dos casos.
Os transtornos do humor podem ter frequência, gravidade e
duração variáveis. Portanto, a depressão pode ser única ou recorrente
(repetir-se várias vezes), de intensidade leve, moderada ou grave e durar
semanas, meses ou anos. Se os sintomas persistirem por anos são chamadas de crónicas.
Se for leve ou moderada, a pessoa ainda consegue realizar suas actividades, com
esforço, algo impossível se ela for grave. A maioria das pessoas que sofre de
depressão não acha que está doente porque não está gravemente deprimida, ou
seja, incapacitada, desesperada ou angustiada. A distimia é um tipo de
transtorno do humor com sintomas depressivos mais leves que da depressão, porém
duradouros e oscilantes, em que predominam irritabilidade e mau-humor.
Frequentemente é confundida com a personalidade da pessoa
e costuma evoluir para depressão. Basta uma única fase de hipomania ou mania,
precedida ou não de qualquer tipo de depressão acima mencionado, para
diagnosticar transtorno do humor bipolar. Depois da primeira (hipo) mania
geralmente alternam-se depressões e euforias de intensidade variável.
Existem 4 tipos de transtorno bipolar. Se houve pelo
menos um período de mania ou estado misto é bipolar tipo I; quando só
aconteceram hipomanias - crises de euforia mais leves que mania - bipolar tipo
II. O estado misto caracteriza-se pela superposição ou alternância num mesmo
dia de sintomas depressivos e eufóricos importantes. Na ciclotimia se alternam
durante anos sintomas de depressão e de euforia ainda mais leves, que duram apenas
alguns dias. Pode ser confundida com um jeito de ser "instável",
"cheio de altos e baixos" e frequentemente antecede sintomas
depressivos e eufóricos mais graves.
Se a depressão, a mania ou o estado misto estiverem
acompanhados de alucinações (sentir, ver ou ouvir algo que não existe) ou
delírios (pensar algo irreal, como achar-se culpado de coisas que não fez, que
está sendo perseguido, que possui poderes especiais, etc.) trata-se do sub-tipo
psicótico.
O transtorno do humor bipolar também pode ser chamado de
transtorno afectivo bipolar ou doença maníaco-depressiva.
O aparecimento do transtorno bipolar se deve a uma
combinação de factores, em que aspectos biopsicosociais desempenham papel
importante no desencadeamento da doença. Assim sendo, tratamentos
medicamentosos, orientação sobre a doença e psicológicos estão indicados. O
segredo está no encontro da combinação ideal para cada paciente.
Se o remédio não for tomado, de nada adianta receitá-lo.
Para aumentar o sucesso do tratamento é preciso esclarecer o paciente e
familiares sobre os sintomas da doença, suas causas, como ela pode seguir
durante a vida da pessoa, quais os riscos, que atitudes tomar durante a
depressão e na mania, como se preparar para as recorrências e assim por diante.
Alguns aspectos são fundamentais. Em primeiro lugar, estará sendo tratado o
diagnóstico de transtorno bipolar, não apenas sintomas depressivos ou
eufóricos. Levando em consideração que a doença é para a vida toda, podendo
hibernar por meses ou anos, o tratamento deve ser planejado para atender as
necessidades a curto, médio e longo prazos.
Na orientação acerca da doença também deve ser abordado o
preconceito. Resolver dúvidas ajuda a diminuí-lo, mas só o tempo poderá eliminá-lo
de vez. Infelizmente pacientes e famílias sofrem durante anos acumulando
ressentimentos, queda do poder aquisitivo, atraso na formação, antes da
aceitação do diagnóstico e do tratamento.
Outra questão a ser aprendida é como lidar com uma nova
crise. Cuidar da decepção, da frustração, da desesperança e além disso prevenir
consequências prejudiciais são fundamentais na recuperação.
Existem vários tipos de substâncias usadas no tratamento
do transtorno bipolar, dependendo do estado em que o paciente se encontra:
estabilizadores do humor, antidepressivos, antipsicóticos e tranqüilizantes.
Para tratar uma crise de depressão pode ser necessário o uso de
antidepressivos, se os estabilizadores do humor não forem suficientemente
eficazes; numa (hipo)mania apenas estabilizadores do humor podem resolver ou se
adiciona antipsicóticos e tranqüilizantes. Estes são os tratamentos de fase
aguda.
Quando a pessoa já teve pelo menos 3 crises ou uma muito
séria e tem o diagnóstico de transtorno bipolar do humor, é aconselhável não
adiar o tratamento de manutenção, para evitar ou reduzir a gravidade de novos
períodos de doença. Os estabilizadores do humor podem bastar para controlar uma
(hipo)mania ou estado misto, mas são os remédios ideais para o tratamento de
manutenção ou preventivo de novos episódios do transtorno bipolar.
É importante lembrar que mesmo a curto prazo, o efeito
dos medicamentos na depressão, na (hipo)mania ou no estado misto leva pelo
menos duas a quatro semanas para ser significativo. A melhora completa pode
levar alguns meses e depois disso é necessário manter as medicações usadas na
fase aguda da doença por mais algumas semanas ou meses, dependendo da
gravidade. Depois de melhorar por completo, não apenas parcialmente, o paciente
segue para a fase de manutenção.
Nesta fase normalmente a pessoa se sente bem e corre o
risco de descuidar do rigor no tratamento medicamentoso. Da mesma maneira como
acontece na hipertensão arterial ou no diabetes, a pessoa se sente bem por
estar tomando remédios. Ela não pode parar sem o consentimento do médico
achando que está curada.
Felizmente dispomos hoje em dia de vários remédios que
podem controlar o transtorno bipolar do humor, de tal modo que se a pessoa não
puder tomar algum deles ou não se beneficiar o suficiente, é possível trocá-los
ou fazer combinações entre eles. Serão mencionados somente os disponíveis no
Brasil.
Estabilizadores do humor são os remédios mais importantes
e devem ser usados a partir do diagnóstico de transtorno bipolar. Controlam o
processo de ciclagem de um episódio a outro, reduzindo a quantidade de
depressões e (hipo)manias e a gravidade delas. Eles variam entre si no efeito
antidepressivo e antimaníaco. Os mais estudados e bem conhecidos são o
carbonato de lítio, a carbamazepina e o ácido valpróico. Com excepção do lítio,
todos eles são também usados como anticonvulsivantes (remédios para tratar
epilepsia).
Antidepressivos são o tratamento indicado para as
depressões. No paciente com transtorno do humor bipolar o médico primeiro
introduz o estabilizador do humor e se não melhorar associa um antidepressivo.
Esta cautela reduz o risco de ciclagem para euforia, que os antidepressivos
podem desencadear. Se isso acontecer, demorará mais para controlar a doença a
longo prazo.
Antipsicóticos são medicamentos de efeito antimaníaco e
antipsicótico. Podem ser usados durante um episódio de depressão, mania ou
estado misto se houver sintomas psicóticos.
─ De primeira geração - por exemplo,
Haldol“, Amplictil“, Stelazine“, Neuleptil“, Melleril“, Navane“.
─ Novos antipsicóticos - por exemplo,
Risperdal“, Leponex“, Zyprexa“, Seroquel“.
Tranquilizantes
representam substâncias com acção hipnótica ou tranquilizante, que devem ser
usados temporariamente, enquanto os estabilizadores do humor não fizerem
efeito.
A ECT é um
dos tratamentos antidepressivos e antimaníacos mais eficazes, indicado nos
extremos da mania e da depressão, para prevenir exaustão ou suicídio, pelo
rápido tempo de acção. Inclui aplicar pequenas correntes de energia durante
rápida aplicação de anestesia geral, para obter uma convulsão de alguns
segundos de duração. Jamais deve ser considerado tratamento de última escolha,
prolongando inutilmente o sofrimento pela falta de melhora com os medicamentos.
É o mais seguro em gestantes e idosos e pode salvar a vida do paciente.
O tratamento medicamentoso é básico, mas o transtorno
bipolar não é meramente um problema bioquímico, também psicológico e social.
Entrar em contato com os sintomas do transtorno bipolar causa sofrimento e pode
ser traumatizante para o paciente e a família. O medo de como isso vai afetar
sua vida, o preconceito, a aceitação do diagnóstico requerem atenção
psicológica. Para aceitar é necessário conhecer a doença a ponto de diferenciar
seus pensamentos e sentimentos e fazer decisões baseado em conhecimento e não
em emoções, como medo ou raiva da doença. Tratamentos psicológicos procuram
fornecer boas informações, orientação e motivação em um ambiente de apoio e
confidencial.
Há vários tipos, dependendo da necessidade específica de
cada paciente, como psicoterapias individual ou grupal, terapia familiar ou
conjugal e orientação psicoeducacional, como mencionado anteriormente.
Durante o curso do tratamento o paciente costuma
enfrentar recorrências, pois o manejo medicamentoso pode demorar até ser
acertado. Tais experiências trazem desapontamento, dúvidas sobre o tratamento,
sentimentos de culpa e de revolta. Na psicoterapia e na orientação sobre a
doença é possível encontrar esclarecimento e apoio necessários para superar
cada novo obstáculo que a doença impõe.
A magnitude das consequências depende da combinação de
uma série de factores: idade de início (quanto mais cedo, mais compromete os
estudos e a formação profissional), gravidade dos sintomas, quantidade de
episódios, tratamento adequado, aceitação do tratamento, apoio familiar,
associação com alcoolismo ou abuso de drogas (praticamente impossibilita o
tratamento), associação com outras doenças, características de personalidade
(fragilidade, imaturidade, dependência), problemas persistentes considerados
sérios pela pessoa.
Antes de mais nada é necessário conhecer a doença e o
tratamento do transtorno bipolar do humor. Mesmo assim, cada novo episódio
representa um desafio, porque se misturam problemas individuais, questões
pendentes, características de cada família.
O apoio ao tratamento é fundamental para ajudar o
paciente em momentos difíceis a manter os medicamentos na dose certa e no
horário prescrito. Bastam alguns dias sem tomar a medicação ou tomando menos
que necessário para que entre em nova crise. Compreender os sintomas não como
seu jeito de ser, mas como doença, alivia muito e reduz o sentimento de culpa
no deprimido. O doente em euforia requer firmeza e paciência, porque o
relacionamento se torna mais desgastante. Ele pode recusar as orientações da
família, alegando que agora toda vez que se sentir feliz e de bem com a vida
logo pensam que está em mania. A intervenção junto ao médico antes que perca a
autocrítica previne consequências piores ou eventual internarão.
─ Se os medicamentos estiverem causando
efeitos colaterais muito incómodos e o paciente mencionar que quer parar com
tudo isso, o médico deve ser informado;
─ Detectar com o paciente os primeiros
sinais de uma recaída; se ele considerar como intromissão, afirmar que é seu
papel auxiliá-lo;
─ Falar com o médico em caso de suspeita
de idéias de suicídio e desesperança;
─ Compartilhar com outros membros da
família o cuidado com o paciente;
─ Estabelecer algumas regras de protecção
durante fases de normalidade do humor, como retenção de cheques e cartões de
crédito em fase de mania; auxiliar a manter boa higiene de sono;
─ Programar actividades antecipadamente.
─ Mesmo depois da melhora, há um período
de adaptação e desapontamento; é importante não exigir demais e não
superproteger; auxiliá-lo a fazer algumas coisas, quando necessário;
─ Evitar chamar o paciente de louco ou
demonstrar outros sinais de preconceito, que favorecem o abandono do
tratamento; tratá-lo normalmente e apontar sintomas com carinho;
─ Aproveitar períodos de equilíbrio para
diferenciar depressão e euforia de sentimentos normais de tristeza e alegria.
A pessoa mais interessada no próprio bem-estar é quem está
doente. O paciente com transtorno bipolar do humor tem uma doença que costuma
durar a vida toda, que se mantém sob controlo com tratamento adequado. Cabe a
ele o esforço de manter o tratamento: é ele quem toma os medicamentos - ou não.
Ninguém pode forçá-lo, a não ser em situações que ponham em risco a sua
segurança ou a de outros. Portanto, se você é portador do transtorno bipolar:
─ Comprometa-se com o tratamento -
discuta dúvidas com seu médico, eficácia dos estabilizadores do humor,
intolerância a efeitos colaterais, etc.;
─ Mantenha uma rotina de sono; mudanças
no sono ou redução do tempo total de sono podem desestabilizar a doença;
converse com seu médico, caso precise mudar o hábito de dormir; - evite álcool
e drogas; além de interagirem com algumas medicações, também agem no cérebro,
aumentando o risco de desestabilização da doença; se tiver insónia ou
inquietação, não se automedique - converse com seu médico;
─ Evite outras substâncias que possam
causar oscilações no seu humor, como café em excesso, drinques, antigripais,
antialérgicos ou analgésicos - eles podem ser o estopim de novo episódio da
doença;
─ Enfrente os sintomas sem preconceito -
discuta com seu médico sobre ele;
─ Se não estiver podendo trabalhar,
"não queime o filme" - é mais sensato tirar uma licença, conversar
com a família ou com o patrão, e se permitir convalescer;
─ Lembre-se: você está bem por tomar a
medicação; se parar de tomá-la, mesmo após 5 ou 10 anos, os sintomas podem
voltar sem prévio aviso; é preciso manter-se alerta para o aparecimento dos
primeiros sinais, como insónia e irritabilidade;
─ Há indícios de que quanto mais crises
da doença a pessoa tiver, mais ela continuará tendo, por isso, procure
participar activamente do tratamento;
─ Descubra seus sintomas iniciais de
nova crise depressiva ou maníaca - tome nota e avise imediatamente seu médico;
─ Aproveite períodos de bem-estar para
redescobrir como você de fato é; como são os sentimentos de tristeza, alegria,
disposição e como você lida com seus problemas;
─ Quanto mais você conhecer a doença,
melhor você poderá controlar os sintomas no período inicial; proteja-se: evite
estímulos de risco em potencial, como decisões importantes, relações sexuais
sem preservativos, projectos ambiciosos, gastos - ponha seus planos no papel e
espere para executá-los quando se reequilibrar; procure canalizar
hiperatividade ou idéias negativas para actividade física ou manual; se estiver
deprimido, dê-se um empurrão, pois a iniciativa está em baixa;
─ Procure e aceite ajuda da família e
dos amigos quando perceber que não consegue se cuidar sozinho.
─ É comum querer parar o tratamento, ou porque
vai tudo bem, ou porque não está dando certo; procure conversar com outras
pessoas com o mesmo problema, que já passaram por isso; lembre-se de como era
seu sofrimento; discuta com a família se valeria a pena buscar uma segunda
opinião sobre o diagnóstico e o tratamento.
Temporariamente o paciente pode ficar inapto a se tratar
adequadamente. Nestas fases a intervenção amiga da família é fundamental.
Há quem considere que o transtorno bipolar do humor
"é como um animal selvagem em sua mente, pronto para escapar a qualquer
momento", e que precisa de grades fortes para ser contido. Às vezes a
porteira se abre um pouco e ele volta a ameaçar - o importante é não deixá-lo à
solta. A luta a ser travada com esse animal é longa e difícil, mas vale a pena
- vale o resgate da própria vida.
Compartilhar essas lutas com outros pacientes e
familiares pode servir de exemplo e motivar quem está a ponto de desistir de si
mesmo.
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