SINDICATO NACIONAL DE PROFESSORES E
TRABALHADORES DO ENSINO NÃO UNIVERSITÁRIO
DISCURSO
UM SINDICALISMO PROGRESSISTA AO
SERVIÇO DE UMA EDUCAÇÃO PARA TODOS
Em nome do Sindicato
Nacional de Professores e Trabalhadores do Ensino Não Universitário (SINPTENU),
agradeço a todos os convidados que nos honram com a sua presença, numa
demonstração dos laços de solidariedade, cooperação e amizade que nos unem, na
caminhada em torno de valores e de objectivos comuns.
Cabe-me a mim, na
qualidade de Presidente Eleito neste Congresso que encerra hoje fazer uma
referência a dois documentos internacionais da qual o Estado Angolano ratificou
e eu passo a citar.
O 1° é a
Recomendação da OIT /UNESCO de 1966 relativa à Situação dos Professores" –
um documento que mantém grande importância e actualidade 50 anos passados sobre
a sua aprovação, quando defende:
- A educação como
um dos direitos fundamentais da humanidade;
- A
responsabilidade dos estados de assegurarem, a todos, uma educação de
qualidade;
- O "papel
essencial dos professores" para o desenvolvimento do ser humano e da
sociedade e a necessidade de "assegurar ao pessoal docente uma condição
que esteja de acordo com esse papel";
- A importância das
organizações sindicais de professores e o considerável contributo que podem dar
ao progresso da educação".
O texto retoma, por
mais do que uma vez, uma concepção progressista de educação: toda a criança tem
o direito a "beneficiar de todas as oportunidades de educação"; a
todos devem ser concedidas "iguais facilidades para a efectivação do seu
direito à educação"... e, mais à frente, "que nada limite a possibilidade
de cada aluno alcançar qualquer nível ou tipo de ensino".
Para isso, a
Recomendação sublinha como prioridade "a atribuição de uma parte
suficiente do rendimento nacional para o desenvolvimento da educação".
O 2° documento a
que quero fazer referência é um conjunto de transcrições de manuscritos e
intervenções de John Dewey, conhecido filósofo e pedagogo norte-americano,
considerado a principal referência da educação progressista na primeira metade
do século XX. Este conjunto de textos - publicado em 1928 pela Federação
Americana de Professores, de que ele era sócio número 1 - tem como título
"Por que é que os professores precisam de um sindicato".
Nas suas
intervenções Dewey explica por que se orgulha de ser membro de um sindicato de
professores, uma "organização de trabalho agressiva, que representa todos
os interesses que os professores têm em comum e que, ao representá-los,
representa também a protecção das crianças e dos jovens nas escolas contra
todos os interesses externos, económicos, políticos e outros, que usariam as
escolas para os seus próprios fins e com isso reduziriam o corpo docente a uma
condição de vassalagem intelectual".
Entre outros aspectos,
realça a acção dos sindicatos na defesa de salários que assegurem "um
nível de vida decente" e o seu contributo histórico para "melhorar a
educação pública e introduzir os princípios e ideais de educação progressista
nas escolas", assim como para "elevar o nível moral, intelectual e
social da profissão".
Usei estas duas
referências para sublinhar uma ideia que tem a ver com o tema proposto para
este congresso: “Formação permanente ao
professor – um desafio para a excelência do ensino”, a intervenção e luta
dos professores, no passado como no presente, tenda a associar os interesses
socioprofissionais com preocupações pela qualidade da educação. Os sindicatos
de professores assumem, assim, uma dupla característica: por um lado são
organizações reivindicativas de direitos laborais, por outro são proponentes de
ideários, de valores e de projectos educacionais e profissionais.
A necessidade de
melhorar as condições de trabalho e defender os interesses específicos de cada
classe profissional é o alicerce em que assenta qualquer sindicato e a marca
inconfundível e inapagável do seu código genético.
O sindicalismo
praticado pelo SINPTENU sempre assentou no pressuposto de que a construção de
um sistema educativo de qualidade é inseparável da valorização social e
material da profissão docente, tendo em conta que a tarefa de formar cidadãos
plenos, capazes de intervir nos mais diversos domínios da sociedade, só pode
ser levada a cabo por profissionais superiormente preparados e motivados. Por
isso, a melhoria permanente das condições de trabalho é, naturalmente, uma
preocupação subjacente a toda a actividade sindical.
Mas um sindicalismo
apenas centrado nos problemas específicos de cada profissão, sem intervir na
sociedade em que ela se insere, é como um médico apenas preocupado em baixar a
febre de um doente, sem cuidar da infecção que a provoca.
Nesta perspectiva,
que encara o movimento sindical como instrumento para a transformação da
sociedade, o sindicalismo docente tem de questionar e colocar no centro da sua
intervenção o papel social desempenhado pela escola.
Sendo um aparelho
ideológico do Estado, a escola é também um terreno onde as forças conservadoras
e progressistas se confrontam. Pode ser um espaço de reprodução ou de
transformação social, consolidar as desigualdades ou contribuir para a sua
diminuição, ter um funcionamento autoritário ou democrático, centrar-se na
qualificação de mão-de-obra para o mercado de trabalho ou no desenvolvimento
integral de todas as capacidades do ser humano, fomentar a competição ou a
solidariedade, promover o conformismo ou o espírito crítico, ter como objectivo
a selecção dos melhores alunos ou o sucesso de todos, ou seja, a escola pode
resignar-se passivamente à ideia de que os alunos são um produto das suas
circunstâncias, ou, por isso mesmo, tudo fazer para humanizar essas
circunstâncias.
O ato educativo é
um ato político, sem qualquer espaço para a neutralidade. Cabe ao sindicalismo
docente apoiar, mobilizar e organizar todos os professores que dão prioridade
aos alunos mais desfavorecidos e que a todos armam com os conhecimentos e
competências que lhes permitam identificar e combater todos os constrangimentos
à sua plena realização pessoal e profissional.
Só neste sentido se
pode compreender o que disse Mandela quando afirmou que "a educação é a
arma mais poderosa que podemos usar para mudar o mundo." Sem educação não
há democracia, porque sem conhecimento não é possível saber quais as escolhas que
nos interessam. Sem educação não há progresso, porque através dela se cria o
capital humano, ou seja, a riqueza mais valiosa e sustentável de qualquer país.
A força desta evidência e o seu alcance estratégico fazem com que a exigência
de uma educação para todos seja a primeira bandeira da luta sindical. Neste
combate, o principal inimigo é o neoliberalismo, que pretende transformar a
educação num negócio, as escolas em empresas e os alunos em consumidores desse
mercado, mas apenas na
justa medida do
poder de compra de cada um.
Só através de uma
escola que seja pública, gratuita, democrática e de qualidade se pode garantir
o direito de todos à educação. Conscientes desta realidade, os governos que
seguem a cartilha neoliberal aplicam invariavelmente a mesma estratégia de
redução progressiva do financiamento ao ensino público. Por todo o lado se
assiste à diminuição da percentagem do PIB dedicada à educação, em Angola, ainda
é um processo em curso. O tamanho da parcela do Orçamento de Estado que é
destinada à educação é o factor mais determinante da política educativa e, por
isso mesmo, tem de ser um objectivo prioritário da intervenção sindical.
Assistindo
frequentemente ao anúncio da sua morte, o sindicalismo continua a ser o
movimento social mais relevante do mundo contemporâneo. Isso deve-se ao lugar
central que o trabalho (ou a falta dele) continua a ter na vida das pessoas.
Mas a vida das pessoas tem outras dimensões e é afectada por muitos outros
problemas que geraram outros tantos movimentos sociais, em torno de causas tão
importantes como a paz, a defesa do ambiente, a igualdade de género, os
direitos humanos, a erradicação do trabalho infantil, a defesa do consumidor, a
luta contra o racismo e a xenofobia e tantas outras. Para benefício mútuo e de
toda a humanidade, o movimento sindical deve estabelecer uma relação mais
aberta e uma acção mais articulada com estes movimentos que trouxeram para a
luta política formas mais criativas de activismo e intervenção pública,
introduziram um novo discurso, assim como novas modalidades de organização.
Num mundo cada vez
mais globalizado e dominado pelos grupos financeiros, nenhum problema tem
solução e nenhum combate se resolve apenas à escala nacional, sem uma
articulação entre o nacional, o regional e o global. Por isso é tão importante
o trabalho que desenvolvemos juntos, nomeadamente com a CGSILA e agora com
CPLP-Sindical da Educação e a Internacional da Educação. Sublinho, por exemplo,
a importância da campanha da IE agora em curso contra a mercantilização e a
privatização da Educação.
Mais do que nunca
se impõe que os sindicatos reforcem a sua coordenação internacional e sintam
como suas todas as lutas sociais contra as injustiças, em qualquer parte do
mundo onde aconteçam. Como nos lembrou Eduardo Galiano" A economia mundial
é a mais eficiente expressão do crime organizado. Os organismos internacionais
que controlam a moeda, o comércio e o crédito praticam o terrorismo contra os
países pobres e contra os pobres de todos os países, com uma frieza
profissional e uma impunidade que humilha o melhor dos bombistas."
Combater este crime organizado é, neste momento, a maior responsabilidade do
sindicalismo progressista, unindo e juntando-se a todas as forças que, à
semelhança de Rosa Luxemburgo, lutam por "um mundo onde sejamos
socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres".
E estou certo de
que cada um de nós saí daqui com uma reflexão que nos ajudará a prosseguir esse
caminho.
Tenho
dito.
AVELINO CALUNGA
Presidente
do SINPTENU eleito em Congresso no dia 17 de Maio de 2016, Luanda - Angola
Leia em versão PDF Aqui.
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