segunda-feira, 15 de maio de 2017

UNIÃO DE FACTO NO REGIME JURÍDICO ANGOLANO - Por VIEIRA MIGUEL MANUEL

INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO KANGONJO DE ANGOLA
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
LICENCIATURA EM DIREITO












UNIÃO DE FACTO NO REGIME JURÍDICO ANGOLANO






RUFINO JOAQUIM USSOVA CASSOMA
NELSON VELICIANO TCHOQUEVA














LUANDA
2017



RUFINO JOAQUIM USSOVA CASSOMA
NELSON VELICIANO TCHOQUEVA
















UNIÃO DE FACTO NO REGIME JURÍDICO ANGOLANO











Monografia apresentada ao Instituto Superior Politécnico de Kangonjo de Angola, como requisito parcial para obtenção de grau de Licenciatura em Direito.

Orientador: Dr. Manuel César Minguela











LUANDA
2017




Dedico este trabalho aos meus queridos filhos e em especial a minha querida esposa, Maria da Graça Tchokeva,pelo apoio e companherismo.

Aos meus pais e irmãos, em especial a minha progenitora Srª Regina Tchokeva,pelo apoio e paciencia pelas vezes em que deixar de estas com ela para estudar.

Dedico também aos meus colegas da sala 23 do curso de Direito do período nucturno e por fim a todos aqueles que direta ou indiretamente estiveram comigo neste processo.

       Nelson Veliciano Tchoqueva


Em primeiro lugar dedico este trabalho aos meus progenitores, por apoiarem esta longa jornada, à minha querida e incansável irmã Dra. Isabel Cassoma pelas aulas administradas, aos meus ilustres e distintos colegas de turma e amigos, aos Doutores Nelson Tchokeva, Venâncio Kalandula, Valeriano Sabino, Apolo Kawele, Adão Marques, Simão Cololo e Hélder Morais, por fim aos distintos professores que dispensaram o seu precioso tempo para nos suportar com especial realce o Doutor Manuel César Minguela.

       Rufino Joaquim Ussova Cassoma




Primeiramente agradeço a Deus pela protecção divina. De igual modo agradeço também a todos os meus colegas da sala 23 do curso de Direito /noite.

Sem me esquecer em especial um muito obrigado a minha querida esposa pela paciência que teve comigo durante estes quatros anos, pelas ausências sucessivas de casa aos meus queridos filhos (Nelvia e Nerio).

Aos meus colegas e amigos em especial ao Sr. Apolo Kawele, Rufino Cassoma, Venâncio Kalandula, Simão Cololo, Hélder Morais, Valeriano Sabino, Adão Marques.

Agradeço em especial aos docentes que com o seu saber contribuíram sabiamente com os seus conhecimentos os Doutores Alberto Lemos, Manuel Minguela, Agostinho da Gama, André Tomas.

No geral agradeço a todos que directa ou indirectamente contribuíram para que hoje fosse possível estar a preparar a minha defesa em direito. Muito Obrigado!

       Nelson Veliciano Tchoqueva


Agradeço a Deus pela graça concedida ao frequentar e concluir o curso ou a licenciatura neste período de 5 anos.
       Rufino Joaquim Ussova Cassoma





Família é encontro, não é sujeição; é abrigo, não é cárcere. O único elo que garante a sua manutenção é o do afecto, que não se impõe, porque nasce da liberdade do bem-querer.


       Cármen Lúcia Antunes Rocha.





O presente trabalho, busca em seu âmago trazer a superfície questões que tem que ver com a união de facto de acordo com as inspirações da Constituição da República, do código civil, do código da família e consequentemente da doutrina por se encerarem neles assuntos pertinentes já que trata-se de uma entidade familiar assente na sociedade angolana por muitos anos. Assim, a importância do quadro de pobreza e miséria, em Angola, constitui permanente preocupação e obriga a reflectir sobre suas influências no social e, principalmente, na área de actuação junto da família, na qual as políticas públicas ainda se ressentem de uma acção mais expressiva. Para tanto, foi realizado um trabalho com linguagem clara no sentido de, primeiramente, abordar de forma breve a evolução do instituto, desde o matriarcado até a concepção da família em Angola isto no período pós independência. Assim, para compreensão da união de facto perante uma constituição que iguala o homem e a mulher dentro da entidade familiar, se faz necessário apresentar seus requisitos, os quais são necessários para sua configuração jurídica. Sendo também abordadas a questão do concubinato, da mancebia, da união de facto nas ordenações monárquicas, sobre a união de facto e o adultério da mulher, dos barraqueiros e dos antecedentes colonial, posteriormente, no segundo capitulo, tratamos da união de facto no direito angolano, sua evolução legislativa, a família na era colonial e nos tempos que se seguiram, conceitualizamos a união de facto, seus requisitos e as questões que tem que ver com seu reconhecimento, local para o reconhecimento, como pode ser feito o reconhecimento e quando, terminado referimos também acerca dos efeitos da união de facto. Como conclusão, poderá se verificar que a união de facto ocupa um papel de grande relevo e é como foi sempre cada vez mais comum em nossa sociedade, apesar de a lei no 1/ 88 de 20 de Fevereiro ter previsto naquela altura em seu preambulo a possibilidade de legalização da união de facto por constituir umas das principais conquistas que na actualidade não se ajusta aos costumes.

Palavra-chave: União de facto. Relação familiar. Regime Jurídico 





The present work seeks at its core to bring to the surface questions that have to do with the union of fact according to the inspirations of the Constitution of the Republic, the civil code, the family code and consequently of the doctrine, That it is a family entity based in Angolan society for many years. Thus, the importance of the poverty and misery framework in Angola is a constant concern and requires reflection on its influence on the social and, especially, on the area of ​​action with the family, in which public policies still resent Of a more expressive action. In order to do so, a work was carried out with clear language in order to first briefly discuss the evolution of the institute, from the matriarchy to the conception of the family in Angola, in the period after independence. Thus, to understand the union of fact before a constitution that equates the man and the woman within the familiar entity, it is necessary to present its requirements, which are necessary for its legal configuration. The issue of concubinage, mancebia, de facto union in monarchical ordinations, on de facto union and adultery of women, barraqueiros and colonial antecedents was also discussed, later, in the second chapter, we deal with the de facto union Angolan, its legislative evolution, the family in the colonial era and in the times that followed, conceptualized the union of fact, its requirements and the issues that have to do with its recognition, place for recognition, how recognition can be done and when , We are also talking about the effects of the union. As a conclusion, it can be seen that the union plays a very important role and is as it has always been more and more common in our society, although the law in 1/88 of February 20 had foreseen at that time in its I preamble the possibility of legalization of the de facto union as one of the main achievements that at present does not conform to customs.

Keyword: Union of fact. Family relationship. Legal regime


al. - alínea
ampl - ampliada
art.º artigo
arts.- artigos
actual - actualizada
C. Civ. - Código Civil
CA - Constituição de Angola
Cód. Fam - Código da Família
ed. - edição.
Ibdem – anterior
no. - Número
pág. - página
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ver. - vide
vol. - volume









SUMÁRIO











A escolha do tema se justifica, pois esclarecer aspectos afectivos no que concerne às relações familiares considerando desde logo sua dimensão cultural e teleológica pode, em uma primeira análise, parecer desmedida uma vez que a afectividade é tida como sustentáculo essencial dessas relações, mas por mais essencialidade e humildade que um acontecimento possa denotar, seus desdobramentos terão de ser objecto de análise para que não se subestime a importância bem como a subjectividade e as especificidades que determinada situação pode produzir.

A Constituição da República angolana não tem trazido em seu âmago modificações significativas no que diz respeito ao resguardo das relações afectivas, afinal a afectividade transborda as relações pessoais enviesando-se por vários ramos do Direito e da sociedade. Tornar a afectividade objecto do estudo jurídico significa situar o Direito no centro das relações familiares. Não se procura com isso tornar enfraquecida a relação biológica, mas apenas valorar o mais intenso, determinante e essencial elo do vínculo familiar.

Assim é que no primeiro capítulo serão apresentados traços históricos da União de facto bem como uma tentativa conceitual de classificar esse instituto. No segundo capítulo serão abordadas as principais classificações no que concerne às relações parentais sócio-afectivas. Já no último capítulo serão, de forma genérica, abordados os efeitos patrimoniais advindos do afecto.


Nos últimos vinte anos, foi introduzida a reforma parcial da lei constitucional tal reforma foi aprovada pela lei no 12/91, seguindo-se a aprovação da lei Constitucional no 23/92, estas que trouxeram várias mudanças ocorridas no plano socioeconómico culturais, adaptadas no processo de globalização da economia capitalista, vêm interferindo na dinâmica e estrutura familiar e possibilitando alterações em seu padrão tradicional de organização. Assim, para o presente trabalho, apresentamos os seguintes objectivos.

·         Apontar a vulnerável situação prática a que se submete a União de Facto que se encontra em termos gerais desassistida pelas políticas públicas, e se vê impossibilitada de responder às necessidades básicas de seus membros.

·         Aprofundar o debate acerca da construção de alternativas para o fortalecimento da união de facto.


Trata-se de um estudo de campo, exploratório, fundamentado na teoria das representações Sociais. Os instrumentos utilizados na colecta de dados foram: testemunho, e entrevista estruturada; Método histórico comparativo que consistiu na comparação de eventos antigos bem como na análise do caminho específico da teoria nos dias actuais, bem com referimos também o método dedutivo que se resumiu no facto de que o desfecho da questão está subentendido na preferência e vai do universal ao particular. Tivemos como base recolhas de dados bibliográficos, a jurisprudência e a prática.

Assim, os resultados mostraram que a união de facto representa carácter agregador conjuntural e desconjuntural, ligado à imagem da família tradicional africana e nesta á angolana, sonhada e construída a partir das relações dos sujeitos no seu dia-a-dia, influenciando e sendo influenciado por relações familiares conflituosas, geradas a partir da pobreza a que estão sujeitas as famílias.








A história da humanidade, assim como os estudos antropológicos sobre os povos e culturas distantes de nós no espaço e no tempo, esclarece-nos sobre o conceito de união de facto, como existiu e existe. Mostra-nos como foram e são hoje ainda variadas as formas sob as quais as uniões de facto evoluem, se modificam, assim como são diversas as concepções do significado social dos laços estabelecidos entre os indivíduos de uma sociedade.

O problema da união de facto começou há muitos séculos. Assim é que encontramos referências sobre o tema em questão bem antes do tempo do Império Romano, notar que na sociedade babilónica, como iremos ver, bem como na Bíblia, se retracta o tema, mas sobre este segundo não nos iremos debruçar. Alargaremos nossa visão contemplando o continente berço, tendo em conta nossos hábitos e costumes.


Em sua obra Geraldo Almeida[1], nos ensina como a união de facto era importante na Babilónia, refere o autor que tal foi objecto de atenção no Código de Hammurabi de 2285 a 2242 d.C. A família babilónica tinha o casamento monogâmico como base, mas era permitido o concubinato[2] ou poligamia[3].



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Aquele código de Hammurabi refere que se um cidadão livre (awílum) casar com uma sacerdotisa naditum, esta poderá oferecer ao marido uma escrava sua para procriação. Os filhos daí resultantes tinham direitos sucessórios, desde que reconhecidos pelo pai. Após a sua morte, a escrava concubina e os seus filhos seriam libertados[4].

O progenitor poderia ainda legitimar formalmente, perante testemunhas, a relação de concubinato com a escrava, tornando-a sua esposa, e dando direitos sucessórios aos filhos da concubina. Outras relações de concubinato estão previstas naquele código com o intuito de as sancionar, em particular se forem de índole incestuosa[5] (entre pai e filha, sogro e futura nora, mãe e filho, enteado e madrasta).


No Direito Romano, paelex[6] é a palavra mais antiga que designa as relações conjugais fora do casamento, assumindo outras formas, sinónimas, como palex e pallaca[7]. Seu significado tem, essencialmente, dois sentidos: lato e restrito. No sentido lato, Paelex equivale às relações fora do casamento, no sentido restrito, refere-se à relação conjugal entre homens casados e uma mulher solteira.


Na República romana entraram em uso as palavras concubina e concubinatos, esta última utilizada para definir qualquer relação não matrimonial. Mais tarde, como se irá verificar, os imperadores cristãos tentaram extinguir as relações conjugais fora do casamento, pelo que o concubinato passou a designar um matrimónio de grau inferior. Contubérnio contubernium caracterizava a relação conjugal entre um homem livre e uma escrava; entre dois escravos; entre dois libertos, cuja relação houvesse iniciado antes da alforria.

GERALDO Almeida refere outras distinções tais como: amica[8], meretrix[9] e scortum[10] que pertencem à categoria das relações extra matrimonial. Por sua vez, ALINE Rousselle[11] entende que existiam pessoas honradas e infames, tal distinção assenta num critério sexual e de liberdade de costumes, acrescentando que nos infames se incluíam os que pertenciam ao meio do teatro, do circo e da prostituição. Tal infâmia interditava o direito ao casamento legítimo e à transmissão hereditária de uma capacidade cívica completa, ou seja, da cidadania romana.


PAUL Veyne[12], define concubina como uma mulher com quem um homem, casado ou não, dormia habitualmente. A palavra concubina tinha inicialmente um sentido pejorativo perante a opinião pública mais tarde condescendente para com os casos de concubinato durável e exclusivo, à maneira de um casamento, e em que apenas a inferioridade social da mulher impedia o homem de transformar tal ligação em núpcias legítimas. Além disso, na opinião dos juristas, a concubina devia ser uma mulher livre (os escravos não podiam casar) e na união monogâmica o homem não podia ser casado, nem ter duas concubinas ao mesmo tempo desde logo, o concubinato afigurar-se em tudo com um casamento, e só assim considerado digno, mas ainda assim um casamento impossível. KASER[13] tem neste último aspecto a mesma visão que PAUL, e define concubinato como uma comunidade permanente de vida e de sexo entre homem e mulher, não reconhecida como matrimónio. É tolerada dentro de certos limites e adquire significado prático na época do Principado nos casos em que o matrimónio não é possível.

Assim, PAUL Veyne refere que o caso mais característico era o de um homem que tinha uma ligação com a sua liberta e não quisesse transformar em núpcias legítimas a união. O imperador Vespasiano, por exemplo, tomou, quando viúvo, uma liberta como concubina e tratou-a quase como sua mulher.


O concubinato não era sempre o substituto de um casamento impossível, nem uma relação monogâmica. Um homem podia ser casado e ainda assim tomar uma concubina. Alguns autores[14] descrevem o sacrifício e as consequências de múltiplas gravidezes para as mulheres romanas. Estas evitam engravidar, isto é, aprendiam a conter-se, tanto mais quando pertencessem à alta sociedade, já que os homens não o faziam. Um marido uxórios[15] Tal como o débito conjugal[16] no casamento eram perigosos, além de raro, tão raro como os casais fecundos que o Imperador Augusto exibia para encorajar a manutenção demográfica das cidades. Pretendia-se que as esposas dessem à luz uma considerável prole de filhos legítimos, mas sem que manifestassem desejo pelos maridos, limitando a relação daquelas com estes à procriação. Considerando tudo isto, PLUTARCO filósofo convicto de que para alcançar a felicidade e a paz é necessário refrear paixões, aconselhava que a esposa suportasse que o marido tivesse relações com uma concubina ou com uma escrava. Na alta sociedade romana, e já desde a República, as esposas não viam inconveniente nestas relações e, não raras vezes, escolhiam as concubinas.

PAUL Veyne diz-nos ainda que, ao contrário das núpcias legítimas, o concubinato não tem consequências de direito, apenas confere honradez pela sua estabilidade e monogamia. As crianças que nascessem de um concubinato digno, cuja mãe fosse liberta, seriam livres. Mas como estas não eram casadas, seriam bastardas, ficariam com o nome da mãe e herdariam desta e não do pai natural. Mas e se um patrono desposasse em núpcias legítimas a sua concubina?

Ao contrário de PAUL, ROUSSELLE diz-nos que Roma tinha criado um direito do concubinato ou seja, as concubinas tinham obrigações, tal como as esposas, a idade exigida para uma ligação oficial era de doze anos, e tal deveria se pautar pela fidelidade obrigatória da mulher concubina, e que restringia a possibilidade de separação por iniciativa de uma liberta, possibilidade de que a escrava estava privada. Além disso, as mulheres libertas entravam na cidadania, seriam mulheres honradas romanas, e podiam transmiti-la aos seus filhos nascidos livres.

Na realidade, além destas famílias compostas pelo homem, concubina e seus filhos, poderiam existir outras combinações entre um homem, e as suas servidoras. Considerando que o esclavagismo era muito comum no Império Romano, era vulgar que da união do senhor com as suas escravas resultassem filhos, que jamais seriam reconhecidos como tal. Estes poderiam ser educados como benjamins da casa, enquanto crianças escravas. Poderiam ser libertos mais tarde, sem qualquer justificação. Os filhos das escravas nesta situação entravam na cidadania.


No final do Império Romano, já no século IV, com o advento do cristianismo e sob o jugo dos imperadores cristão, se estabeleceram proibições de uniões entre pessoas de estatutos diferentes. Uma mulher livre que se unisse ao seu escravo seria condenada à morte pelo fogo ou receberia vergastadas. Se um cristão se unisse com uma judia ou vice-versa, e os que se unissem a bárbaros sofreriam as mesmas sanções penais. Do que era, uma impossibilidade de casamento legítimo e que tornava os esposos concubinos, tornou-se passível de sanções. A Igreja Cristã não provocou isto, apenas fixava regras de pureza das uniões, por exemplo, através de recomendações em sermões.

O Cristianismo dava importância à pureza das mulheres e admitia o direito romano do casamento. As concubinas eram aceites desde que tivessem tido apenas um homem e de terem guardado todos os filhos. Os homens deviam mandar embora as suas concubinas e tomar uma esposa legítima.

O direito do império ratificou assim a ideia de que o concubinato não era honrado e lesava os direitos da esposa sobre o marido. Simbolizava uma vitória do amor exclusivo e derrota da protecção das mulheres de condição superior.

Mais tarde, verificou-se uma supressão do concubinato legal. Admitia-se a legitimação dos filhos nascidos de uma concubina desde que o pai não fosse casado, e durante a governação do Imperador Constantino proibiu-se a manutenção de uma concubina por parte de homens casados, a adopção do filho de uma concubina sem autorização e assistiu-se ainda à restrição de liberalidades às concubinas e aos seus filhos. Os maridos viram-se obrigados a apoiar-se em relações extra matrimoniais muito passageiras o que não é concubinato e a terem relações mais frequentes com as suas esposas.





As Ordenações da Monarquia são colectâneas do direito vigente na época correspondente, e que pretendiam evitar não só as incertezas derivadas da grande dispersão das normas, mas também o prejuízo para a vida jurídica e a administração da justiça daí resultante. Existem Ordenações Afonsinas, Manuelinas, Filipinas[17].

As Ordenações Afonsinas foram publicadas em 1446 ou 1447, sob o título de ordenações, em nome de D. Afonso V. Estas, são as mais importantes, pois as restantes essencialmente actualizaram as ordenações Afonsinas, pelo que estas serão as abordadas neste trabalho.

Encontramos alusões à união de facto nas Ordenações Afonsinas, assim refere CAETANO que as classifica como crime contra a moralidade. Dentro deste tipo de crime inclui-se o crime de sedução, muito diferente da união de facto, pois o primeiro refere-se à corrupção de uma mulher virgem por ternuras, induzimento ou dádivas[18].


Quando um casal se julga legitimamente casado, sem que o casamento seja juridicamente válido casado de feito e não de direito, vive, portanto, em união de facto. Se o amante tivesse relações com a mulher, com má intenção, ou seja, pensando que esta era legitimamente casada, ambos seriam ameaçados com a pena de morte[19].

Um casal podia ainda viver em comunhão de cama e mesa, sem serem casados, mas com fama de marido e mulher portanto, em união de facto. Se esta tivesse relações com outro homem, o seu amante incorreria em pena mais branda que a de morte, consoante a sua intenção, enquanto nenhuma pena caberia à mulher, pois esta nunca foi casada, logo não haveria adultério.
Ambas as leis valorizam o elemento moral da infracção, pois que graduam a pena em função da intenção.


Estes eram homens casados que mantinham barregãs, ou seja, amantes. Este crime era punido por uma lei de D. João I, atribuindo multas proporcionais de acordo com a categoria social ou riqueza dos infractores. A primeira reincidência consistiria em multa agravada, a segunda em açoites públicos e degredo para as mulheres, e uma pena para homens conforme decisão do juiz. D. Afonso III proibiu ainda a entrada de barregãs na Corte, resultando tal infracção em desterro na Corte com pregão público para o barregueiro e sua barregã tal proibição manteve-se nas Ordenações Filipinas.


A nossa realidade social é caracterizada pela presença maioritária de valores e referências espirituais da cultura tradicional africana, a que se sobrepõem valores e referências da cultura ocidental de importação. A tudo isto acresce a influência dinâmica da globalização cultural universal.

Por força dessa combinação cultural, existem dois grandes tipos de organização familiar na nossa sociedade:

·         Família tradicional.
·         Família do tipo europeu.

A família tradicional é em regra extensa, podendo ser poligâmica[20]. Este tipo de organização é originário e inerente ao sistema cultural tradicional angolano, em todas as suas matizes regionais e locais.

Começou por ter inspiração espiritual materialista, mas não é incompatível com a visão cristã do mundo. Predomina nos meios rurais, mas vigora também em largas faixas da população urbana, independentemente do estrato a que pertençam os seus membros. Nos meios urbanos, o tipo de organização familiar tradicional é seguido pela população que não aderiu ao sistema de organização familiar do tipo europeu, ou que prefere conduzir a sua vida familiar com base nos valores e referências da cultura tradicional.

A família organizada de acordo com os padrões da cultura europeia constitui o tipo de família de referência legal em Angola casamento[21]. O quadro normativo de regulação do fenómeno familiar no nosso sistema jurídico inspira-se neste modelo de estruturação familiar. Por isso, as soluções jurídicas para os factos e processos familiares que encontramos na ordem jurídica angolana têm no sistema jurídico romano-germânico e na visão cristã do mundo o seu modelo normativo inspirador. A organização familiar do tipo europeu pode apresentar-se na forma de família nuclear stricto senso formada por pai, mãe e filhos; ou segundo alguma das variantes da família extensa consanguínea; ou por conjugação dos dois tipos de família predominantes: tradicional e europeu. A família organizada de modo ecléctico, conjugando elementos do tipo tradicional e do tipo europeu, é muito comum nos meios urbanos, representando uma forma de transição cultural do sistema familiar tradicional para o europeu, ou vice-versa.

Assim, importa ter-se em conta o código civil português de 1867, Este código, também conhecido como Código de Seabra, manteve o regime das Ordenações no que toca ao estatuto da concubina ao proibir as doações feitas pelo homem casado à sua concubina (art.º 1480.º) e impedir a disposição de bens pelo cônjuge adúltero a favor do seu cúmplice (art.º 1771.º). Almeida diz-nos que a concubina não tinha direito a alimentos mas admitia-se, nos termos do art.º 2361.º, que a concubina exigisse indemnização caso fosse abandonada pelo seu consorte, razão que justificaria igualmente que esta se separasse do seu companheiro, conforme argumenta Fonseca.


Dedicaremos alguma atenção, no plano do direito comparado, ao tratamento que tem sido dado à união de facto. É ponto assente que este fenómeno pode cobrir uma serie de realidades sociais, dificultando o traços dos seus contornos jurídicos. Assim, são adoptadas as mais variadas expressões para descrever tal realidade, qual seja uniões livres, uniões de factos, uniões estáveis, casamento de facto, casamento do segundo grão ou convivência more uxório, em todo o caso, característica essencial da união de facto parece ser a da sua livre dissolução, ao contrário do casamento formal, pois, por mais simples que seja o divórcio, este é geralmente necessário para a sua dissolução. Alias, como facilmente se prevê, quanto maiores forem as dificuldades para obtenção do divórcio, maior será a tendência para se recorrer às uniões de facto. Porém, por outro lado, verifica-se como refere MARY Glendon[22] uma certa tendência para a desregulação do casamento, acompanhada de um paralelo reconhecimento de maiores efeitos jurídicos às uniões de factos, conducentes a um certo esbatimento das diferenças tradicionalmente notadas entre as duas figuras. Tendo isto em consideração, e assumindo o risco da simplificação, podemos destacar três grandes modelos de articulação da realidade factual com o domínio jurídico.

Em primeiro lugar, importa destacar aqueles sistemas jurídicos que elevam o que à partida seria uma união de facto à condição de fonte autónoma de relações jurídicas em paridade com o casamento formalizado. Efectivamente, apesar de, na generalidade dos ordenamentos jurídicos, o conceito de casamento se associar ao de casamento devidamente formalizado, há sistemas em que basta o mero consenso das partes, sem qualquer solenidade, para que uma união estável entre um homem e uma mulher, verificando certos requisitos, seja assimilada a um verdadeiro casamento. Ou seja, é dado relevo jurídico à união de facto como verdadeiro casamento, abrangendo assim o conceito de casamento formal e o casamento solo consensu[23]. Foi esta a solução seguida em certos sistemas anglo-saxónicos em relação ao common law marriage[24], na China, relativamente aos casamentos não registados e na antiga União Soviética quanto aos casamentos de factos[25].

Nos Estados Unidos, a instituição do common law marriage que remonta à famosa decisão Reed do Suprme Court[26] de Nova Iorque, de 1809[27], ditadas pelas dificuldades, existentes na época, na celebração de um casamento devidamente formalizado, e pela diversidade cultural e religiosa entre os vários grupos de emigrantes, continua a ser reconhecida em vários Estados, ainda que nem sempre o seu reconhecimento seja pautado por requisitos uniformes. Efectivamente, ao passo que certos Estados se bastam com o mero consenso das partes relativamente não estabelecimento de uma comunhão de vida familiar[28], outros exigem ainda a prova da consumação ou coabitação ou mesmo a reputação pública de serem marido e mulher. De qualquer modo, e porque se trata de um autêntico casamento, terá sempre de ser dissolvido através de um divórcio[29].

Em contextos culturais completamente diferentes, importa referir o casamento não registado na República Popular da China e o casamento de facto da Ex-União Soviética. Delimitado no tempo, pois apenas vigorou entre 1927 e 194458, onde se encontrava o casamento de facto da antiga União Soviética, que era definido como a coabitação de facto de um homem e uma mulher baseada no mútuo consenso de serem marido e mulher[30] todavia, a herança de uma sociedade profundamente religiosa bem como os inconvenientes práticos pela figura, conduziram ao legislador a restabelecer, em 1944, o controlo estatal do casamento. Quanto ao casamento não registado da República Popular da china, trata-se igualmente de um casamento puramente informal equiparado ao casamento formal registado[31].

Saliente-se num segundo grupo, os sistemas que adoptam o que designaríamos como casamentos de segundo grau, que apresentam menor densidade de efeitos jurídicos face aos casamentos informais ou solo consenso. Os casamentos de segundo grau são uma fonte autónoma de relações familiares.

Em Portugal assim como na França por exemplo, o reconhecimento da união de facto é pontual[32], em todo caso, a intensidade e extensão das intervenções legislativa pode variar de ordenamento para ordenamento o que, como é óbvio terá consequências quanto ao nível da protecção conferida aos companheiros.


A organização das nações unidas tem no seu nobre empenho de pacificação colaborado para transformar os princípios norteadores do direito da família no sentido de melhor justiça social e da elevação da dignidade humana. Tal contribuição segundo MEDINA[33] esta profundamente ligada aos princípios fundamentais dos direito à liberdade, à igualdade inerentes a pessoa humana e que se repercutem no meio da estrutura familiar.

Tal é a concepção da carta das Nações Unidas, onde se proclamam os direitos humanos e a igualdade de direitos entre homens e mulheres, de igual modo, a Declaração Universal dos direitos humanos, aprovada em 19 de 12 de 1948 que consagra no seu art.º 16º a relação familiar, que será tida em conta a partir da idade núbil, ou seja, homem e mulher tem o direito igual quanto ao casamento, não se faz naquela lei menção da união de facto.

Referir que o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos dos Direitos Económicos, aprovado em 1966 no seu art.º 10, onde reconhece a família como elemento natural e fundamental da sociedade[34].

De igual modo, a carta africana dos direitos humano e dos povos, aprovada em 1981 rectificada por Angola pela resolução 1/92.Nesta carta, se confere à família como sendo núcleo natural e base da sociedade, evitando-se a descriminação da mulher.

Todavia, e segundo MEDINA, Angola não faz ainda parte de nenhuma convenção em matéria de direito da família, apesar de segundo a doutrinadora existir vínculos familiares com Portugal, cabo verde, S. Tomé e Príncipe e países africanos vizinhos sendo desta forma necessário que se encontrem normas comuns para a solução de conflitos.




O Direito de Família angolano, é, por consequência, a acessão jurídica de entidade familiar, passou no período compreendido entre 1916[35] e 1975, por um grande processo de transformação. Enquanto a família ditada pelo Código Civil de 1916 se define como hierarquizada e de feição transpessoal, em outro momento e contexto político-económico, a Constituição de 1975 não trouxe em seu texto definições que consagrassem a pluralidade familiar, a igualdade substancial e a direcção diárquica. Pois que, primeira constituição, isto no período pós independência era segundo Medina de natureza programada e organizada, pois não se fazia menção à família.


O ordenamento jurídico angolano, se inspirou no português que por sua vez buscou no Direito Romano alguns dos seus fundamentos como, por exemplo, o patriarcalismo que foi reproduzido no Código Civil de 1916.

O Código Civil de 1916 regulava a família do início do século passado, constituída unicamente pelo matrimónio. Em sua versão original, trazia uma estreita e discriminatória visão da família, limitando-a ao grupo originário do casamento. Impedia sua dissolução, fazia distinção entre seus membros e trazia qualificações discriminatórias às pessoas unidas sem casamento e aos filhos havidos dessa relação.

Esta família, decorrente do casamento, era denominada de legítima o que estava conforme a lei, composta por marido, mulher e filhos, ou em algumas situações por ascendentes ou seja, os avós.

O casamento tinha como pressuposto a virgindade da mulher, sendo que o defloramento desconhecido pelo marido era tido como erro essencial sobre a pessoa (art.º 219 CC/1916) possibilitando a anulação do casamento (art.º 220 CC/1916).

Os demais núcleos familiares, ou seja, os que não se enquadravam neste perfil, eram denominados de ilegítimos, o que já demonstra o preconceito atribuído e uma noção implícita de certo e errado. Assim, aqueles que não se enquadravam no perfil daquele código, eram tidos como marginalizados e recebiam tratamento diferenciado. Ressaltasse que nem os filhos eram poupados por esse tipo de discriminação, pois também eram denominados de legítimos e ilegítimos conforme fossem oriundos ou não do matrimónio[36].


Com o advento reformista da Constituição[37] de 1991/1992, como bem diz a professora MEDINA, instaurou -se os princípios fundamentais respeitantes a família bem como a igualdade entre o homem e a mulher, passando a proteger os membros da família, bem como a família constituída pelo casamento e a união estável. Consagrou a igualdade entre os filhos, havidos ou não do casamento, ou por adopção, garantindo-lhe os mesmos direitos e qualificações. Notar que o no 1do art.º 29º da lei no 23/92 vai reconhecer à família como núcleo da organização da sociedade e como tal, terá especial protecção do estado, segundo, refere que quer se funde em casamento ou em união de facto.

Esta é a posição acolhida também pela actual constituição[38] nos termos do art.º 35º nº1, atribuindo ao estado a obrigação de permitir aos seus cidadãos uma vida familiar estável ou normal, garantindo deste modo a lei igualdade entre homens e mulheres (no 3 do art.º 35º), conferindo-lhes os mesmos deveres no seio familiar.
Ainda há que salientar, que em nosso direito moderno, não apenas é reconhecido o casamento e a união estável, como facto constitutivo de uma entidade familiar, mas também outros modelos de família[39].

Nesta senda, importa ter-se em conta que o actual código da Família, preocupou-se reconhecer alguns institutos tirados do direito costumeiros, aproveitando o que de rico nos ensinou a experiência dos povos africanos, é nesta direcção notória que referimos a união de facto pela sua preponderância na nossa realidade social.

Assim sendo, o Direito de Família na actualidade não tem mais por objecto à família legítima, pois a evolução dos tempos impôs a reconsideração e a ênfase dos aspectos sociais e afectivos. Como consequência disso a Constituição através do §1), 5) art.º 35, reconheceu outros modelos de família que não apenas os oriundos da relação de casamento (como a união estável, o núcleo composto por um dos genitores e seu filho e os casais que já possuem filhos e unem-se em união estável formando um novo núcleo familiar), aplicou o princípio da isonomia aos cônjuges, igualando-os, e proibiu qualquer discriminação de tratamento entre os filhos, pouco importando a sua origem, posição confirmada pelo Cód Fam que prevê, ainda outros modelos de constituição familiar qual seja pelo parentesco, pelo casamento, pela união de facto, pela adopção e pela afinidade nos termos do art.º 7 o Cód Fam.


A nossa realidade social é caracterizada pela presença maioritária de valores e referências espirituais da cultura tradicional africana, a que se sobrepõem valores e referências da cultura ocidental de importação. A tudo isto acresce a influência dinâmica da globalização cultural universal.

Por força dessa combinação cultural, existem dois grandes tipos de organização familiar na nossa sociedade: família tradicional e família do tipo europeu. A família tradicional é em regra extensa, podendo ser poligâmica. Este tipo de organização é originário e inerente ao sistema cultural tradicional angolano, em todas as suas matizes regionais e locais. Começou por ter inspiração espiritual animista, mas não é incompatível com a visão cristã do mundo. Predomina nos meios rurais, mas vigora também em largas faixas da população urbana, independentemente do estrato a que pertençam os seus membros. Nos meios urbanos, o tipo de organização familiar tradicional é seguido pela população que não aderiu ao sistema de organização familiar do tipo europeu, ou que prefere conduzir a sua vida familiar com base nos valores e referências da cultura tradicional.

Nas famílias estruturadas de acordo com o sistema tradicional, em regra os processos de casamento, paternidade e de hereditariedade obedecem ao princípio uterino de linhagem. Segundo os critérios que presidem a este tipo de linhagem, os membros das famílias a que pertence cada um dos cônjuges são os que resultam dos laços uterinos anteriores ao casamento. As relações e factos familiares posteriores ao casamento seguem a linha uterina de cada cônjuge. Assim, os filhos pertencem à mãe e estão vinculados à família desta, pois considera-se que, em última análise, a ligação uterina de procriação é mais decisiva do que a ligação testicular, designadamente em sede de dúvida sobre a paternidade. Seguindo a linha materna, o poder paternal sobre os filhos do casal é exercido pela mãe e pelos seus irmãos uterinos, os tios. Na senda do mesmo princípio matrilinear, na constância do casamento os bens são geridos com alguma autonomia por cada um dos cônjuges. Depois da morte de um deles, ou da separação do casal, os bens são repartidos pelos familiares uterinos de cada cônjuge.

A família organizada de acordo com os padrões da cultura europeia constitui o tipo de família de referência legal em Angola. O quadro normativo de regulação do fenómeno familiar no nosso sistema jurídico inspira-se neste modelo de estruturação familiar. Por isso, as soluções jurídicas para os factos e processos familiares que encontramos na ordem jurídica angolana têm no sistema jurídico romano-germânico e na visão cristã do mundo o seu modelo normativo inspirador. A organização familiar do tipo europeu pode apresentar-se na forma de família nuclear stricto senso[40] formada por pai, mãe e filhos; ou segundo alguma das variantes da família extensa consanguínea; ou por conjugação dos dois tipos de família predominantes: tradicional e europeu. A família organizada de modo ecléctico, conjugando elementos do tipo tradicional e do tipo europeu, é muito comum nos meios urbanos, representando uma forma de transição cultural do sistema familiar tradicional para o europeu, ou vice-versa.



Okulomba[41] é o termo que perdurou durante o período colonial mesmo quando era imposta o estatuto dos indígenas, este consistia como é ainda hoje na formalização da relação familiar[42], esta fase, antecedia a do casamento okukwela[43], consequentemente, na sua maioria as pessoas depois de realizar o noivado okulomba imediatamente ia para casa de seus esposos e formavam imediatamente uma família[44] reconhecida por toda a comunidade, com o passar dos tempos houve transformações importantes que algumas vezes relegaram este carácter originário destas sociedades.

Assim, no direito angolano, procurou-se recolher alguns institutos tirados do direito costumeiro, aproveitando o que de rico ensinou a experiência dos nossos povos, pois que relativamente a união de facto, encontrou preponderância na realidade social angolana. Assim é que feita esta abordagem, importa conceitualizar a união de facto como relação familiar.

ROBERTO Senise[45] ensina que união de facto (estável) é a relação íntima e informal, prolongada no tempo e assemelha ao vínculo decorrente do casamento civil, entre sujeitos de sexo oposto, que não possuem qualquer impedimento matrimonial entre si.

Para OLIVEIRA[46] esta relação se caracteriza pela vontade de vida em comum, tornando-se necessário apenas tal não se consubstancia num simples ficar ou seja se exigem requisitos para sua configuração como entidade familiar. Das definições possíveis, fica patente que para a sua compreensão, deve-se antes entender os requisitos para sua formação, sendo que para tal feito necessário a observância do código de família.
Das definições possíveis, fica patente que para a sua compreensão, deve-se antes entender os requisitos para sua formação, sendo que para tal feito necessário a observância do código de família.


Tanto o código civil como a lei da família, não nos expõem uma noção de união de facto. Certamente, porque o nosso legislador considerou desnecessária a definição de um conceito jurídico para uma situação de facto constatada pela sociedade e que se consubstancia numa convivência de habitação conjugada com a existência de relações sexuais a que a doutrina designa de comunhão de leito, mesa e habitação[47].

Assim, a família, em sentido jurídico, é constituída pelas pessoas que se encontram ligadas pelo casamento, união de facto, pelo parentesco pela afinidade e pela adopção (art.1576.º do Código Civil)[48]. A relação matrimonial é a que se estabelece entre os cônjuges em consequência do casamento[49]. O contrato de casamento afecta profundamente o estado das pessoas, os seus direitos e obrigações, não só de carácter pessoal, como patrimonial. O art.º. 1577.º do Código Civil define casamento como um contrato entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma comunhão de vida[50].

A união de facto é, em direito angolano, relação familiar[51]. Não é regulada de modo semelhante ao casamento, embora produza alguns efeitos de direito, contrariamente, em Portugal onde tal não é considerada pela doutrina de Campos[52] e FRANCISCO[53], pois que para aqueles autores, a União de Facto equiparam-se a relações familiares para determinados efeitos, denominando-a como sendo relação para familiar, porém concordamos com FRANCISCO quando questiona se as relações sexuais fortuitas, passageiras, acidentais se configuram na união de facto. Satisfazendo a questão, FRANCISCO[54] refere que tal não se configura na união de facto. Pois refere o autor que na União de Facto é exigida a vivência em condições semelhantes a dos cônjuges[55], referindo que apenas poderá ser entre duas pessoas, e não com três ou mais. Desde logo, discordamos com a posição segundo a qual, o casamento seja a única fonte com dignidade para gerar relações familiares, pois não é esta a tendência da constituição, muito menos do legislador ordinário.

Em Angola, e segundo MEDINA, o enquadramento legal do instituto no período pós colonial, encontrou-se disposto na Lei no 7/80 de 27 de Agosto, onde, nos termos do art. 5º se estabelecia tal conformidade como sendo a relação entre homem e mulher com carácter permanente e exclusiva relevância jurídica idênticas á do casamento. Relativamente aos seus antecedentes históricos, impõe-se a previsão da resolução no 2/82 da Assembleia do Povo, que veio dar prioridade na revisão legislativa prevendo deste modo á legislação do instituto da União de Facto. Em sua Obra, MEDINA refere que no relatório que antecedeu o projecto do Cód. Fam, dizia-se a propósito na folha 11 a União de Facto é a união entre um homem e uma mulher com o fim de fazerem vida comum, distinguindo-se do casamento apenas por não haver formalização ou legalização da união.

Referindo a autora que os fundamentos de sua existência em nosso país diferem dos fundamentos de existência em outros países Europeus e nos desenvolvidos, pois que em última análise, o instituto em nosso país encontra predominância, justificando esta posição, a académica MEDINA refere que isto tem a ver com questões ideológicas, culturais e tradicionais, a isto tudo, acresce a inexistência de órgão de registo civil necessários para sua legalização, bem como por razões económicas.

Ressalta desde logo que o objectivo do Estado parece-nos ser o de legalizar o maior número de União de Facto se consideramos o carácter social que o casamento desempenha na sociedade[56].

Assim importa considerar o quadro que se segue, sobre um estudo do Governo Angolano e da Unicef realizado para o quinquénio 1999-2003, apresentado para cidade de Luanda e sobre o estado civil dos adultos com mais de 20 anos de idade[57].


A partir deste quadro, podemos facilmente perceber que existe uma desconexão exacerbada entre a prática e a legislação, ou seja, o legislador, não têm sabido adequar com acuidade o instituto em estudo, pois que o mesmo se encontra em desconformidade com os tempos que correm. Daí levantarmos a questão sobre os condicionalismos para sua legalização bem como as questões inerentes ao instituto em especial.


Apesar de dispensar os formalismos necessários ao casamento, começa a se caracterizar pela vontade de vida em comum[58], tornando-se necessário apenas o mútuo consenso dos companheiros, podendo este surgir devagar, conforme evolução da relação amorosa.

Entretanto tal aprimoramento difere do simples ficar, ou seja, exige requisitos para a configuração da União de Facto como entidade Familiar.
Deste modo, para compreender a formação da União de Facto, deve-se entender os requisitos da sua formação, sendo que para uma perfeita compreensão dos requisitos que caracterizam tal união antes se faz necessário atentar para o facto de que o art. 112º da Lei no 1/88 de 20 de Fevereiro define união de facto como estabelecimento voluntario de vida em comum entre um homem e uma mulher.

Desta disposição se estabelece os seguintes requisitos:


Para ser reconhecida a União de Facto, esta deve ser uma relação entre um homem e uma mulher, conforme disposto na última parte do art.º 35º da CA, bem como a ultima parte do art.º 112 do Cód Fam, neste caso, o legislador privilegiou o modelo clássico de União de Facto prevista na Constituição e no Cód Fam.


Convém ressaltar a importância da convivência entre o casal da União de Facto, uma vez que o art.º 112º do Cod Fam, traz em seu texto o adjectivo vida em comum o qual se origina este requisito, pois que é a convivência sob o mesmo tecto que define a União de Facto.


EUCLIDE de Oliveira[59] sustenta que a convivência terá de ser pública, isto é de conhecimento no seio familiar e social onde vivam os companheiros, assim, esta relação não poderá ser secreta. É necessário entender que a publicidade é o conhecimento da união de facto na sociedade que o casal frequenta, ou seja, os parentes, amigos e conhecidos do casal, que consideram os mesmos como se estivessem casados.





No que tange a durabilidade prazo de convivência o Cód Fam nos termos do art.º 113º limitou o tempo em 3 anos.


O vínculo entre os companheiros deve ser único, uma vez que esta relação deve ter carácter monogâmico, sendo a relação caracterizada com mais de um companheiro, será proibida, pois que será adultério, pelo menos assim ensina a doutrina de OLIVEIRA. Referir que o ilustre doutrinador ainda destaca que quando o participe de uma segunda união não tiver conhecimento da existência de impedimento consequente de anterior e simultânea união do seu companheiro fica caracterizada a união de facto putativa, sendo que, o convivente que agiu de boa-fé terá resguardado os seus direitos decorrentes da união que parecia de facto. Para tal, a relação deverá cingir-se pela durabilidade, publicidade, continuidade e com o propósito de constituir família, enquanto sua invalidade não for reconhecida ou declarada em face de uma união mais antiga e que ainda permaneça. O Cód Fam, no art.º 121º no que tange a unicidade de vínculo ensina: o reconhecimento da união de facto, está sujeito a anulação nos termos gerais previstos para anulação do casamento esta disposição legal, remete-nos para o art.º 67º § e bem como as seguintes relativas á anulação do casamento.


Como referido, a união de facto precisa ser duradoura, ou seja, ela deve ser também continua, com o intuito de à diferenciar da união de um relacionamento eventual, nisto consiste o carácter de coabitação invocado pela primeira parte do art.º 113º do Cod Fam.

A importância do espírito da continuidade para a formação de família e para a procriação é de suma importância, para dar equilíbrio ao instituto.





Para a configuração da união de facto é necessário que os companheiros não possuam impedimento matrimonial, porém quis o legislador exceptuar os casos de separados judicialmente ou de facto, não se admitindo a ligação adúltera de pessoa casada, simultaneamente ao casamento, sem estar separada de facto do seu cônjuge, nem se admite as relações impuras, incestuosas ou imorais, como por exemplo a de ascendente com descendente, afins na linha recta, e os demais casos previstos no § 2 art.º11 e seguintes do Cod Fam.

Assim, a união de facto por encontrar predominância local, deve ir de encontro com a moral, o bem-estar social, pois esta entidade vai se tornando cada vez mais comum nos tempos actuais.


Notar que o § 3 do art.º 116º do Cód Fam prevê que os interessados venham declarar o regime de bens por que optam à semelhança do que está previsto no § 3 do art.º 29 sobre a declaração inicial do casamento, pois que tal, não possuem um carácter obrigatório, mais sim facultativo, refere MEDINA, pois que se os interessados nada disserem, aplicar-se-á a regra supletiva geral disposta nos termos do art.º 49º§ 3, ficando desde logo a união de facto sujeita ao regime económico de comunhão de bens adquiridos.




A doutrina de MEDINA refere que ao processo de reconhecimento da união de facto por mútuo acordo são subsidiariamente aplicáveis as disposições respeitantes ao processo de casamento quanto a fase preliminar de iniciação do processo, porém, referem a doutrinadora que esta difere do casamento por não se dar a cerimónia matrimonial.

Assim, e segundo a doutrinadora, se entende que a previa subsistência de vida em comum torna excedente a declaração solene de aceitação do outro como cônjuge, confirmado pelo facto de se requerer o reconhecimento da vontade dos membros, consignados nos termos do art.º 118º do Cód Fam, desde logo trata-se de um acto administrativo.

Este reconhecimento é outorgado pelo registo civil da área de residência dos companheiros, o mesmo, deverá obedecer as formalidades avocadas nos termos do art.º 116º Cod Fam qual seja, que da solicitação se fará acompanhar documentos de verificação dos pressupostos legais, bem como as testemunhas ou documento emitido pela administração local, acresce a isto a declaração sob o regime económico, sendo que à não declaração sujeita os companheiros ao regime económico de bens adquiridos (art.º 49º§ 3) conforme referido.


Relativamente a este aspecto, o Cód Fam consertou bastante concedendo a permissão de reconhecimento a posterior quer em relação aos filhos, quer de natureza patrimonial, contando para todos os efeitos que tal exigência seja elaborado pelo tribunal, através de uma acção própria proposta para o efeito, a proferir uma sentença por via da qual se declare ter existido entre A e B uma situação jurídica de união de facto (art.º 122º Cód Fam), consequentemente, o art.º 123º atribui legitimidade para intentar na acção de reconhecimento da união.

Porém, parece-nos desajustada a legislação, pois que em última analise o art.º 6º Cód Civ, se refere a ignorância e mal interpretação da lei, que terá como consequência a sanções delas resultantes. Pois que nos parece que uma lei como esta, em primeiro lugar deve ser ajustada as praticas actuais que não ponham em causa a moral, a ética e os bons costumes, somos conscientes em reconhecer que não se deve impor o direito, todavia, concordamos que ao estado impele o dever de publicitar mais o Cod Fam principalmente nas questões que tem a ver com o instituto, por a família ser o núcleo fundamental da organização da sociedade, e ser objecto de protecção do estado nos termos do art.º 21º CA § b), c), d) e k), bem como do art.º 1º e segts Cód Fam.

Considerando o não conhecimento de seus direitos, apesar da previsão legal quanto ao prazo para acção de reconhecimento, somos a concordar com a Ministra da Família e Promoção da Mulher[60], quando apelou a revisão das Lei que rege a constituição de um lar ou família em Angola, bem como do código que estabelece a união entre os casais, tendo em conta que existem muitos a viver em união de facto frisou, notar que para todos efeitos julgados necessários, a acção do reconhecimento judicial termina no prazo de dois anos. Está disposição não estará a violar os direitos dos seus cidadão?

Repare que a Ministra referiu relativamente ao caso levantado nos seguintes termos é preciso que haja um registo por escrito, ou carta de pedido, que proteja esta união de facto, para que o enlace matrimonial esteja salvaguardado. Assim, no caso de reconhecimento judicial, o tribunal devera ouvir o concelho de família[61], e a ser reconhecida, produzirá os mesmos efeitos que na dissolução do casamento por morte ou por divorcio, e deverá para todos efeitos estar sujeita a registo (art.º126º Cód Fam).

Porém, não nos parece que a carta de pedido esteja prevista legalmente, todavia é um sinal de moldar o instituto aos factos actuais, unindo nele aspectos consuetudinários no caso a carta de pedido poderia no futuro regime ser entendido como o acto solene para legalizar a união de facto, considerando claro, os demais requisitos tais como; a idade, a convivência habitual igual ou superior á três anos e todas as demais. Pois que na actualidade e fruto da constatação feita, reparamos que na sua maioria, a união de facto não é legitima, pois para que o seja, devera revestir a previsão constante das § a) e b) Cód Fam qual seja, para que produza efeitos jurídicos, seguindo todos os procedimentos avocados, tal como referido no §2 do art.º 1 Cód Fam.

Desde logo, e da leitura do art.º 119º Cod Fam encaramos o efeito produzido pelo Instituto, porém o legislador não refere quais efeitos, remetendo-nos para as disposições dos efeitos do casamento.

Tratando-se dos efeitos pessoais a doutrina têm sido unânime em concordar que os unidos de facto não usufruem do direito de acrescentar ao seu nome o apelido do outro, nem a sua relação lhes permite a aquisição da nacionalidade. Também, não existe discordância quanto aos efeitos pessoais expressamente previstos na legislação, tais como a permissão da adopção, os seus membros tiverem mais de 25 anos; o direito a recusar-se a depor como testemunha; o direito de gozar férias no mesmo período, se trabalharem na mesma empresa ou na Administração Pública; ou a presunção de paternidade, se existir, no período legal da concepção, comunhão duradoura.

Contudo, já existem diferenças de pontos de vista no que concerne aos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência, previstos para o casamento no art.º 43º do Cód Fam. Pereira e Guilherme[62] defendem que não existe qualquer efeito pessoal, quanto a estes deveres, decorrente de uma relação de união de facto.

Já França[63] considera que estes deveres, se podem aplicar às uniões de facto, criando o direito a indemnizarem nos termos gerais, agravado pela relação existente entre os companheiros. Na aplicação destes deveres às uniões de facto se deverá verificar os âmbitos diferentes face ao regime do casamento. Assim, para este último autor, a infidelidade na união de facto é apenas condenável no plano ético ou social, por não existir disposição legal que crie o dever de fidelidade, mas susceptível de criar a obrigação de indemnizar nos termos gerais.

Neste assunto, discordamos dos autores, FRANÇA, porque afirma existirem todos os deveres conjugais menos o da fidelidade, de PEREIRA e GUILHERME por considerarem que não existe nenhum. Pensamos, pois, que não existem deveres conjugais na união de facto, excepção feita ao dever de coabitação. Os outros deveres conjugais poder-se-ão exigir ao companheiro, não por ser companheiro, mas porque se exigem a todos os cidadãos. E é nesta mesma medida que se lhe poderão ser exigidos. Se dúvidas houver, facilmente são superadas pela análise dos argumentos justificativos da eventual indemnização que será concedida nos termos gerais. Se é nos termos gerais, então o companheiro está no mesmo patamar de qualquer outro cidadão. Quanto ao dever da coabitação, ele existe e a sanção à sua não verificação é a própria extinção da união de facto.

Em nossa concepção, basta a não exigência de um dos deveres conjugais ou a impossibilidade de adquirir um apelidos do outro membro da união para, legitimamente, se poder afirmar que na união de facto não existe plena comunhão de vida no plano pessoal. Discordamos, assim, da perspectiva de PITÃO.


No casamento, o legislador definiu um conjunto de regimes de bens, permitindo aos casais a opção por um deles. Quanto aos efeitos patrimoniais na união de facto não importa a titularidade da coisa, desde que tenha sido adquirida na constância da união. O problema que surge então é em relação à prova da união. Haverá ou não necessidade de registo da mesma e quem tem competência para tal? O registo, o notário ou apenas o bairro onde residem as partes? Certamente o legislador estaria a obrigar o registo de toda a relação e talvez se colocasse o problema da vontade das partes.

Seja como for, julgamos que estas questões merecem muita atenção e reflexão sob pena de continuarmos a discriminar as mulheres. Constata-se ainda que a diferença de tratamento resultante da própria lei traduz-se por sua vez na desigualdade de direitos entre os cidadãos principalmente do sexo feminino, uma vez que só no casamento existe a segurança absoluta em termos legais.

Portanto, a lei continua a tratar o casamento civil como um privilégio e as pessoas casadas civilmente são privilegiadas em relação às que vivem em união de facto, uma vez que a própria Lei da Família estabelece que a união de facto deverá ser livre e notória entre um homem e uma mulher é apenas reconhecida para efeitos patrimoniais.

No nosso entender esta situação abre espaço para o desrespeito para com as mulheres em particular e para com a sociedade em geral. Consequências do não reconhecimento da união e outras formas de união que também não estão protegidas.

Embora a Lei de Família, no seu preâmbulo, refira que tem como princípio o respeito pela diversidade cultural do país, os chamados casamentos tradicionais ou religiosos só são plenamente reconhecidos após o seu registo. Portanto, o reconhecimento destas formas de união depende, uma decisão que pouco provavelmente as pessoas que não tiverem escolhido o casamento civil tomarão. Neste contexto, se não forem registados, os casamentos tradicionais e canónicos[64] têm o mesmo efeito da união de facto, porém sem eficácia jurídica, para que haja tal eficácia, devem ser observados os aspectos legais para o efeito (§art.º1 do art.º113º e 112 Cód Fam. Ou seja, em termos práticos, não se verifica o respeito e a dignificação que a lei pretende atribuir a estas formas de casamento.






As dificuldades de tratamento e enquadramento legal dos factos familiares tradicionais na realidade jurídica angolana, estão relacionados com a forma institucionalmente distinta da administração dos fenómenos familiares em presença na nossa sociedade, por parte das entidades oficiais, pelo que se impõem os desafios normativos.

As dificuldades resultam fundamentalmente das diferentes filosofias jurídicas e espirituais em que assentam o conceito de família tradicional seguido pela maioria da população e o conceito de família de referência legal que, não sendo o seguido pela maioria, a ele estão, contudo, vinculadas as autoridades. É que o conceito de família tradicional, estando ancorado na cultura tradicional e nos valores espirituais materialista e ou cristão, não tem um quadro normativo positivo de suporte legal. Já o conceito de família do tipo europeu, baseado na cultura ocidental e nas referências cristãs católicas, tem uma ordem jurídica a sustentá-lo. Em nossa concepção, o grande desafio do direito a constituir, de jure condendo, consiste em encontrar um sistema normativo que combine equilibradamente as concepções e formas de estruturar e organizar o sistema familiar na nossa realidade sociocultural.

O reconhecimento constitucional da união de facto como meio de constituir famílias, representa um esforço louvável no sentido da aproximação entre as duas realidades culturais da sociedade angolana em termos da estruturação jurídica da família. A pouca aderência à solução legal do Código da Família sobre o processo de reconhecimento da união de facto, evidenciada ao longo dos anos de vigência desse código, veio mostrar, porém, que há ainda muito caminho a percorrer, em termos da conciliação das bases filosóficas e conceptuais e dos objectivos constitucionais da família em Angola. Por isso, dos que têm a nobre e histórica tarefa de trabalhar na revisão do Código da Família, espera-se alguma criatividade, espírito inovador e muito realismo.

Por último, gostaríamos de fazer notar neste resumo que com a união de facto o problema do nosso grupo alvo continua, havendo necessidade de garantir a este grupo maior dignidade e o desfrute dos seus direitos humanos. Está claro desde logo que há necessidade de regulamentar a união de facto ou outro instituto que regule as relações entre pessoas não unidas por matrimónio. O ideal seria que este instituto tivesse os mesmos efeitos jurídicos que o casamento civil, tanto ao nível das pessoas envolvidas como ao nível de bens, para o bem de uma justiça equitativa.

O argumento de que se deve dar às pessoas que não pretendam contrair matrimónio a oportunidade de viver em união de facto não é aceitável, se tivermos em conta que, como dissemos anteriormente, a maior parte das mulheres na nossa sociedade não tem capacidade de negociar a sua condição social, sujeitando-se à vontade do companheiro.

Olhando para os efeitos da união de facto verificamos que se trata de uma solução apenas aparente. Constata-se ainda que a diferença de tratamento resultante da própria lei traduz-se por sua vez na desigualdade de direitos entre os cidadãos principalmente do sexo feminino, uma vez que só no casamento existe a segurança absoluta em termos legais.





Considerando a utilidade prática do instituto, considerando também á necessidade de aprimorar a legislação desajustada e gritante apresentamos como sugestão as seguintes: Com urgência que se ajuste e se regulamente a união de facto ou outro instituto que regulem as relações entre pessoas não unidas por casamento.

Que o estado representado pelos seus órgãos sociais e parceiros, fomente abertura de mais universidades, com maior enfoque para o curso de direito, fazendo coincidir a qualidade e a necessidade, indo de encontro as comunidades ou seja, formar as pessoas para estas poderem contribuir nas suas localidades.

Que haja mecanismos contínuos e de publicidade nos mídias para a consciencialização das normas vigentes atinentes a questões familiares.

Que os estudantes formados em direito nas universidades públicas e privadas, devessem ser aproveitados pelo executivo para darem seu contributo na construção de uma sociedade que se quer justa e que respeite os direitos fundamentais começando pela família, por esta representar a célula base, afinal, apenas seremos aquilo que a nossa sociedade querer de nós.





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[1] ALMEIDA, Geraldo da Cruz Da União de Facto: Convivência more uxório em Direito Internacional Privado.
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[2] Concubinato, em acepção actual, é um termo jurídico que especifica uma união formalizada pelas relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, (casamento civil), mas reconhecido como união estável, reprimida moralmente e aceita por lei como modalidade de união estável entre conviventes.
[3] ALMEIDA, Geraldo da Cruz Da União de Facto: Convivência more uxório em Direito Internacional
Privado. Lisboa: Pedro Ferreira, 1999, pág. 112.
[4] HAMMURABI, The Oldest Code of Laws in the World: The code of laws promulgated by Hammurabi,
King of Babylon B.C. 2285-2242. [s.l.]: Project Gutenberg Literary Archive Foundation, 2005,§144,
§145, §171
[5] Relações com parentes ou afins.
[6] Termo em latim que em português significa fora do
[7] Termo em latim que em português significa fora de
[8] Termo em latim que significa em português extra matrimonial.
[9] ibdem
[10] idem
[11] ROUSSELLE, Aline, A política dos corpos: entre procriação e continência em Roma. In PANTEL, Pauline Schmitt, org. História das Mulheres: A Antiguidade. Porto: Afrontamento, 1993. pág. 380.
[12] VEYNE, Paul, O Império Romano. In ARIÈS, Philippe; DUBY, Georges, História da Vida Privada: Do Império Romano ao Ano mil. Porto: Afrontamento, 1989, pág. 85.
[13] KASER, Max, Direito Privado Romano. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, pág. 330.
[14] ROUSSELLE, Aline, A política dos corpos: entre procriação e continência em Roma. In PANTEL, Pauline Schmitt, org. História das Mulheres: A Antiguidade. Porto: Afrontamento, 1993. pág. 378, 380,
384-385
[15] Apaixonado.
[16] Denominação que significa direito-dever do marido e de sua mulher de realizarem entre si o acto sexual.
[17] COSTA, Mário Júlio de Almeida História do Direito Português.2.a ed. Coimbra: Almedina,1992, pág 260 e ss.
[18] CAETANO, Marcello, História do Direito Português. Lisboa: Verbo, 2000, pág. 563, 553.
[19] MAIA, Anabela Ordenações Afonsinas: Livro V. Coimbra: Instituto de História e Teoria das Ideias da Faculdade de Letras de Coimbra, Título XXIII.
[20] A poligamia é conhecida como casamento plural.
[21] Lei nº1/88 art.º 120º
[22] MARY, Ann Glendon, Patterns of Contemporary Legal Response to the Social Phenomenon of the facto Marriange, in Konflikt und Ordnung, Festschrift fur Murad Ferid zum 70. Geburtstag, C.H. Munchen, 1978, pág. 492 e ss.
[23] Termo em latim que significa em português apenas consentimento.
[24] Termo em inglês que significa em português união estável
[25] Vide P, Striewe, Auslandisches und Internationales Privatrecht der nichtehe-lichen Lebrnsgemeinschaft. Carl Heymanns. Koln, 1986, pág. 369 e ss, veja-se igualmente CRUZ Almeida, Da união de facto, convivência more uxório em Direito Internacional Privado, Lisboa, pág. 61-62, 160-161, 223 e ss e consequentemente 231 e ss, com apresentação do tratamento conferido pelo sistema cabo-verdiano à união de facto que, inspirado pelo regime cubano do matrimónio no formalizado, conduz a uma equiparação da união de facto reconhecida a um casamento solo consensu.
[26] Termo em inglês que significa em português corte do Tribunal Supremo.
[27] D. Coester, Waltjen, International Encyclopedia of Comparative Law. Vol. IV Persons and Family, chief editor, GLENDON Ann Mary , Chap.3 Formation of Marriage, 1997, Mohr Siebeck, Tubingen, pág 72 e ss.
[28] Também na Inglaterra o common law marriage foi reconhecido como um casamento meramente consensual, em íntima ligação com a adopção do princípio canónico consensu facit nuptias em 1085, ano em que William, o Conquistador, colocou sob a jurisdição dos tribunais eclesiásticos as questões matrimoniais, ainda que, como nota GLENDON Mary refere pág. 497 esta figura não seja coincidente com a homóloga norte-americana.
[29] Ao contrário do que sucede com a união de facto que, como já GLENDON Mary refere na pág 497.
[30] P. Striewe pág. 369 ss, desde logo, importa sublinhar o facto de na China se incentivar e até aparentemente se impor o registo do casamento informal, ainda que esse registo apresente um carácter meramente declaratório e com efeitos retroactivos relativamente ao inicio do matrimónio informal . efectivamente, se refere F. unzel, National Reports, People s Republico f China vol. I Molir Tubingen, 1996, pág. 82, não obstante a falta de registo levar a que as partes sejam severamente criticadas e incitadas a procederem ao registo  não podem contudo casar com outra pessoa sem primeiro se terem divorciado do cônjuge de facto vide Muezel pág 37 e ss. Entre nós, vide, quanto ao
casamentos não registados na China, A, Marques dos Santos, Reconhecimento em Portugal de um casamento celebrado na China por cerimonia privada e seus efeitos em matéria de atribuição da nacionalidade portuguesa aos filhos havidos desse casamento in Estudo de Direito da Nacionalidade, Coimbra, Almedina, 1998, pág 213-254.
[31] P. Strirwe pág 369 e ss, ressalta desde logo o facto de na China se incentivar e até aparentemente se impor o registo do casamento informal, ainda que esse registo apresente um carácter meramente declaratório e com efeitos retroactivos relativamente ao inicio do matrimónio informal vide Munzel pág 82.
[32] Gaudemet Tallon, ob. Cit pág 161
[33] MEDINA, Maria do Carmo, Direito da Família, colecção da Faculdade de Direito UAN Luanda editora 2001 pág. 19
[34] Vide de igual modo o art. 23 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos dos Direitos Económicos.
[35] Reformado pelo Decreto-lei no 47 344, de 25 de Novembro de 1967, mandado aplicar nas províncias ultramarinas.
[36] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4.ed.,ver. actual e ampl. São Paulo: ed. Revistas dos Tribunais, 2007.
[37] ANGOLA. Lei Constitucional (nº 12/91; lei no 23/92) Constituição da República de Angola. Luanda: Imprensa Nacional, 1992.
[38] ANGOLA. Constituição (2010) Constituição da República de Angola. Luanda: Imprensa Nacional, 2011.
[39] Art.º 7º da lei nº 1/88 de 20 de Fevereiro
[40] Termo em latim que significa em português sentido estrito
[41] Termo em umbundo (ovilombo) que significa cerimónia que marca a relação familiar entre duas pessoas do sexo oposto e simboliza o enlace matrimonial tradicional ou seja o alambamento.
[42] Em Portugal denomina-se noivado tido como a celebração que anuncia à sociedade que duas pessoas resolveram prometer-se em matrimónio.
[43] No período antes da colonização, bastava realizar ovilombo para ser considerado matrimónio, com a colonização e a implantação da Igreja Católica Apostólica, houve a necessidade de ajustar aquele rito à outros, sendo por esta via coexistindo o casamento civil e o religioso e o tradicional. Assim okukwela é o termo em umbunbu que significa realizar a cerimónia matrimonial
[44] Em algumas regiões de Angola, como por exemplo no Uíge, os hábitos e costumes não permitem partir para outra forma de constituição familiar sem antes realizar o noivado, sendo que tal atitude acarretaria para a pessoa que assim procedesse falta de sorte e os filhos por assim dizer não viveriam por muito tempo.
[45] LISBOA, Roberto Senise. Manual Elementar de Direito Civil 5 ed. Da família e das sucessões. Ed RT, 2002 pág. 135.
[46] OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável, do concubinato ao casamento 6o ed actual. E ampl S. Paulo ed Método, 2003 pág. 125.
[47] MEDINA, Maria do Carmo, Direito da Família, colecção da Faculdade de Direito UAN Luanda editora 2001 pág. 267.
[48] Ver também o art.º 7º do Cód. Fam
[49] Relação entre um homem e uma mulher reconhecida publicamente pelos órgãos de justiça art.º 20 Cód Fam.
[50] CAMPOS, Diogo Leite de Lições de Direito da Família e das Sucessões. Coimbra: Almedina, 1997.pág 120.
[51] Artigo 35º CA
[52] Ibidem
[53] OLIVEIRA, Francisco Coelho Guilherme, Curso de Direito da Família, vol I Introdução Matrimonial 4a ed. Coimbra editora, pág 51
[54] OLIVEIRA, Francisco Coelho Guilherme, Curso de Direito da Família, vol I Introdução Matrimonial 4a ed. Coimbra editora, pág 52.
[55] Posição adoptada também por MEDINA, Maria do Carmo, Direito da Família, colecção da Faculdade de Direito UAN Luanda editora 2001 pág. 467 e segs.
[56] Vide nota de rodapé nº 270 de MEDINA, Maria do Carmo, Direito da Família, colecção da Faculdade de Direito UAN Luanda editora 2001.
[57] ibdem
[58] MEDINA, Maria do Carmo, Direito da Família, colecção da Faculdade de Direito UAN Luanda editora 2001. Pág.272.
[59] OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável, do Concubinato ao Casamento, 6a ed São Paulo, 2003, pág 132.
[60] Fonte: TPA noticiário de 09-06-2010 (Genoveva Lino). Reagia ao casamento consumado recentemente, de um casal, cujo noivo, já vivia maritalmente com outra mulher durante 12 anos, com quem teve 4 filhos, e estava grávida do quinto. De acordo com a titular da pasta da Família, é preciso que haja um registo por escrito, ou carta de pedido, que proteja esta união de facto, para que o enlace matrimonial esteja salvaguardado.
[61] Do levantamento feito, não pudemos encontrar nenhuma família que possua o conselho de família, todavia, não queremos com isso dizer que não exista, mas se haver será em escalas muito diminutivas.
[62] GUILHERME, de Oliveira, FRANCISCO, Pereira Coelho Curso de Direito da Família Volume I 4.aed. Coimbra Editora Ano: 2008 pág. 120 segts.
[63] PITÃO, França José de António, A União de Facto no Direito Português (a propósito da Lei no 135/99) Coimbra, 2000, pág. 100 e segts.
[64] Vide preâmbulo da Lei no 1/88 de 20 de Fevereiro relativamente abolição do casamento católico.

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