ÍNDICE
No presente trabalho será abordado
inicialmente o contexto histórico da gravura, a litografia como técnica que
viabilizou o consumo das imagens. Tratar-se-á ainda das principais técnicas de
gravação, a sua função no processo de hibridização das culturas e o seu carácter
expansivo para os meios de comunicação. Bem como será enfatizado os aspectos de
memória, identidade e representação presentes na gravura.
A informação vem se
reproduzindo e disseminando pelo mundo de diferentes formas. Na sociedade
contemporânea, os meios digitais apresentam-se como os principais elementos
para a transmissão de dados e troca de informações. No entanto, o presente
trabalho retoma algumas reflexões sobre um dos mais antigos meios de reprodução
e circulação da informação, a gravura. Para começa é definida como gravura a imagem
obtida através da impressão de uma matriz artesanal. O material da matriz pode
variar, e classifica o tipo da gravura.
A gravura é uma linguagem
visual que é obtido a partir da impressão em um papel de uma imagem proveniente
de uma matriz que pode ser de madeira, metal ou pedra.
Essa arte é a mídia mais
antiga do mundo, apenas quando foi descoberto o processo de gravação a partir
de uma matriz que começou a ser feito reproduções em papel, editar livros,
folhetos, surge o jornal e etc.
A gravura é dividida
basicamente em 3 tipos: a xilogravura, gravura originada da madeira, na qual o
artista entalha a madeira e depois faz a impressão em uma folha de papel, temos
também a gravura em metal que é feito a partir de uma chapa de metal e a
litogravura, que é uma gravura que vem da pedra, o artista desenha na pedra com
um giz de litogravura e depois transfere a imagem para o papel através de uma
prensa.
A gravura está presente na
história dos meios de comunicação e da arte como um artefacto valioso que
utilizou cronologicamente da madeira, do metal e da pedra para expandir nas
formas de reprodução da escrita e da imagem. Trouxe contribuições significativas
para o desenvolvimento dos processos gráficos.
Inicialmente, observa-se do ponto de vista
histórico, que a gravura foi utilizada na China, para a estampagem da seda e em
seguida utilizada na impressão tabular, substituindo então, os livros medievais
caligrafados. Segundo Dasilva (1976), na China e na Pérsia desde os tempos mais
primitivos foi empregado o estêncil para estampar os tecidos. No século II
a.C., os chineses já imprimiam no pergaminho, usando como matriz a pedra cavada
por sulcos.
A gravura no Ocidente surgiu a
partir do século XV com a imagem impressa e a sua própria reprodução. O
processo de gravação ocorria inicialmente com a xilogravura, tornando possível
copiar a imagem diversas vezes.
Sobre as técnicas de gravação
e seus processos de produção, pontuamos alguns aspectos. Inicialmente com a
xilogravura, que é a técnica por meio da qual são feitas as matrizes de madeira
para a sua impressão. [...] “os europeus utilizaram intensamente a xilogravura
para produzir imagens sacras – santinhos – e cartas de baralho, em papel
pergaminho” (COSTELLA, 2006: 35).
A gravura em metal surge no
século XV, porém ganhou força a partir do século XVI, podendo ser feita por
processos distintos como a água-tinta, a água-forte e a maneira negra, ela
alcançou um nível maior de precisão das imagens com traços mais delicados,
aspectos que não estavam presentes na gravação sobre madeira.
No final do século XVI, com
os Carracci e especialmente com Agostino, a gravura assume a dignidade de uma
técnica artística autónoma, admite-se que a gravura não transmite apenas a
imagem ou o tema, mas também, mesmo operando em um nível distinto e através de
uma série de mediações, o valor integral da obra. (ARGAN, 2004: 16)
Nesse período de
aprimoramento, a gravura se consolida como uma importante técnica de difusão
cultural, principalmente no que se refere aos temas religiosos. Argan (2004)
coloca que a Igreja Católica revalorizou as imagens que a Reforma depreciara e
proibira; encorajou a formação e a difusão de uma nova iconografia sacra que
fornecesse a todos os fiéis os mesmos objectos e os mesmos símbolos para uma
devoção de massa; servindo-se da gravura como um meio poderoso de propaganda
religiosa.
Ao final do século XVIII surge
a litografia, técnica baseada na impressão plana que utiliza matrizes de pedra
calcária. Ela representou um grande avanço, sobretudo, para os meios de
comunicação da época.
Com a litografia, as técnicas
de reprodução marcaram um progresso decisivo. Esse processo, muito mais fiel –
que submete o desenho à pedra calcária, em vez de entalhá-lo na madeira ou de
gravá-lo no metal – permite pela primeira vez às artes gráficas não apenas
entregar-se ao comércio das reproduções em série, mas produzir diariamente,
obras novas. Assim, doravante, pôde o desenho ilustrar a actualidade quotidiana.
E nisso ele tornou-se íntimo colaborador da imprensa. (BENJAMIM, 1983: 6)
A partir da litografia, a
gravura atinge o seu ponto mais importante enquanto suporte para as imagens de
consumo, viabilizando “uma série de demandas e exigências geradas pela
revolução industrial” (FABRIS, 2008: 12). No processo litográfico descoberto
por Alois Senefelder, em 1797, o desenho original e o desenho impresso são
quase que idênticos, surgindo então a informação visual de primeira mão. A
facilidade de execução, o menor custo dos equipamentos, a recuperação das
pranchas e o arquivamento do desenho no papel fazem da litografia uma técnica
revolucionária.
Segundo Fabris (2008),
levando-se em conta que no século XIX, uma parcela considerável da população
era analfabeta, a necessidade de informação visual era grande e crescente,
principalmente para a propaganda política e para a publicidade comercial. Esses
são factores que levam muitos estudiosos a considerar que a partir de então a
imagem impressa atinge sua maioridade.
Dessa forma, observa-se a
técnica litográfica como factor preponderante nas relações de consumo,
propagando informação e conhecimento, estando directamente relacionada ao
crescimento da indústria no século XIX e consequentemente no século XX.
Dessa forma, reitera-se a
relevância da gravura para a formação da imprensa, disseminando conhecimento
através do trabalho editorial, contribuindo para o desenvolvimento das ciências
e da cultura em geral.
A partir dos relatos dispostos
anteriormente sobre a história da gravura, fica evidente que o processo de
confluência de diferentes culturas a partir da propagação da informação
aconteceu quase que naturalmente. Dessa forma, a gravura pode ser analisada
como um suporte importante para o processo de hibridização das culturas.
A circulação da imagem e o
diálogo com a arte de diferentes locais enriqueceu e reconfigurou as práticas
culturais do ponto de vista estético e intelectual. Essa fusão cultural fica
evidente, por exemplo, nos traços da pintura europeia presente nas obras de países
orientais, latinos e norte-americanos; da mesma forma ocorre a influência
desses países sobre na arte do “velho mundo”.
Encontrar uma mesma imagem em
países ou regiões distantes do local de origem; seja em um museu, exposição ou colecção
particular, faz da gravura uma arte extensiva, na contramão da escassez. Ela
tem esse poder multiplicador ímpar perante as demais expressões artísticas. A
gravura não só influencia como também dá novas alternativas de mudança dentro
do que já foi feito no meio de uma determinada sociedade.
A idéia de hibridização
cultural muitas vezes está ligada à mistura de diferentes etnias dentro de uma
sociedade, como se observa nas grandes metrópoles, no entanto é possível
perceber também a hibridização ocorrendo em actividades mais específicas como é
o caso do artesanato, das artes plásticas, da culinária, dentre outras.
A tradução entre culturas pode
parecer um fenómeno do mundo globalizado devido à rapidez com que as pessoas de
diferentes lugares estão se comunicando, mas essas trocas de informações vêm
ocorrendo a bastante tempo, nesse contexto a gravura está inserida como um objecto
tradicional nas relações de interacção cultural.
Assim, enfatiza-se a
finalidade que a gravura tem de estabelecer uma nova percepção sobre a
pluralidade de linguagens proveniente dessa mescla de manifestações culturais e
a sua contribuição na formação das culturas híbridas.
2.5
Originalmente, a coisa gravada
era destituída de valor estético, sendo apenas uma presença testemunhal. Ainda
não estabelecia relação com nenhum sistema de representação. Porém mais tarde,
o objecto gravado se enquadrou no universo dos objectos estéticos
representativos. Inicialmente com valor simbólico, não se figurava como um objecto
de arte; a gravura era usada apenas para marcar o lugar, mas sem ostentar uma
vontade artística. No entanto, ao final do período oitocentista e início do
século XX as pesquisas sobre os acervos iconográficos ganham força e desperta a
atenção dos estudiosos.
A partir dos estudos
realizados nas últimas décadas sobre as representações, práticas e identidades
culturais, foram feitas relações com as colecções de obras de arte e documentos
de diferentes acervos públicos e privados. De forma que os historiadores
denominaram tais pesquisas como uma cultura de coleccionar. A prática do coleccionismo
está relacionada também à necessidade de trazer para o contexto da sociedade
contemporânea novas discussões e possibilidades de diálogos desses acervos com
os novos suportes de criação e informação.
Resgatar a memória é interesse
não só dos historiadores como do público em geral, [...] “esse interesse cada
vez maior provavelmente é uma reacção à aceleração das mudanças sociais e
culturais que ameaçam as identidades, ao separar o que somos daquilo que
fomos”. (BURKE, 2005: 88)
Sem dúvida, há um interesse
popular pelo resgate da memória. Assim sendo, é importante intensificar o
trabalho de pesquisa sobre a memória presente nos acervos, de forma a reafirmar
e fortalecer a necessidade de conhecer o passado, pois [...] “a história da
memória é um campo que revela com rara clareza a importância dos esquemas ou
estereótipos, e esses esquemas ajudam a perpetuar as memórias”. (BURKE, 2005:
88)
Através das diferentes técnicas
de gravação já citadas anteriormente criaram-se obras que nos falam das
paisagens, costumes e cenas religiosas que instigam o observador a perceber que
diferentes símbolos podem ter a mesma representação e importância embora
pertençam a culturas diferentes.
Na gravura, é possível
observar a proporcionalidade e o equilíbrio dos traços e linhas. Ela ainda
revela realidades ocultas e muitas vezes podem interiorizar as impressões e
sons locais de épocas distantes.
A partir dos acervos de
gravuras é possível encontrar diferentes temas que possibilitam uma imersão em
períodos da história da iconografia brasileira que revelam importantes relatos
de época.
Podemos citar como exemplo o
álbum Brésil Pittoresque (1859) de autoria do fotógrafo francês Victor Frond.
Foi o primeiro livro de litografias, realizado na América Latina, o qual reuniu
um total de 78 imagens que foram litografadas na casa de impressão Imprimerie
Lemercier, em Paris.
Observa-se assim que as
produções artísticas tomaram caminhos ainda mais extensos, disseminando
conhecimento e reflexão a partir das formas imagéticas, utilizando o suporte
litográfico como meio divulgador de novas propostas.
A gravura reafirma sua
importância para o alargamento dos meios de comunicação, de forma que suas
técnicas, respeitando as limitações de época, souberam implementar nos suportes
todo um imaginário do seu tempo.
Popularizou-se aquilo que fora
um privilégio de poucos até então, novas concepções de espaço também geraram a
posse simbólica do que até então era completamente desconhecido. Se hoje a
informação circula pelo mundo em velocidade quase que instantânea, no passado
os povos tinham na imagem gravada sobre madeira, no burilado sobre metal e no
desenho sobre a pedra um aparato tecnológico para acessar os acontecimentos no
mundo, ditando assim os primeiros caminhos dos meios de reprodução que hoje
fazem parte do nosso quotidiano.
Entender o caminho dos meios
de comunicação nos últimos séculos é relevante do ponto de vista da perpetuação
da própria história cultural da informação e seus desdobramentos.
Portanto, a gravura enquanto objecto
artístico-cultural aponta os caminhos para identificar e pontuar essa trajectória,
revelando novas formas e perspectivas para o desenvolvimento dos estudos
culturais.
ARGAN, Giulio Carlo. Imagem e
persuasão: ensaios sobre o barroco. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
BURKE, Peter. O que é história
cultural? Rio de janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.
BURKE, Peter. Hibridismo
Cultural. São Leopoldo: Unisinos, 2003.
COSTELLA, Antonio F.
Introdução à gravura e à sua história. Campos do Jordão, SP: Editora
Mantiqueira, 2006.
DASILVA, Orlando. A arte maior
da gravura. Ed. Espade, 1976.
FABRIS, Annateresa.
Fotografia: Usos e Funções no Século XIX. ed. 1. reimpr. – São Paulo: Editora
da Universidade de São Paulo, 2008.
HALL, Stuart. A Identidade
cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
MARTINS, Itajahy, 1927 –
Gravura: arte e técnica /Itajahy Martins. – São Paulo: Laserprint: Fundação
Nestlé de Cultura, 1987.
Textos escolhidos / Walter
Benjamin, Max Horkheimer, Theodor W. Adorno, Jürgen Habermas; traduções de José
Lino Grünnewald ... [et al.]. São Paulo; Abril Cultural, 1983. (Os pensadores).
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