A ORIGEM DO TRÁFICO DE ESCRAVOS
EM ÁFRICA
SUMÁRIO
No
presente trabalho vamos falar acerca da Origem do Tráfico de Escravos em
África, veremos a origem e formação social, bem como os diferentes tipos de
escravidão e por fim, a escravidão no contexto africano que é objectivo da
nossa pesquisa.
Para
começar é importante dizermos que o estudo do processo de escravização dos
povos africanos é essencial para que se compreenda a situação actual de
desigualdade no planeta. Revela uma longa história de exploração e subjugação
de populações fragilizadas por outras, mais equipadas. Demonstra também que a
desestruturação econômica e cultural tem efeitos desastrosos de longa duração.
Pois, do ponto de vista econômico, a escravidão foi uma forma eficiente de
acumulação primitiva. No que diz respeito às pessoas, foi uma violência
irreparável, que pressupõe, dentre outros fatores, a existência de povos muito
pobres, mão-de-obra excedente que possa ser explorada em benefício de uma
minoria. Assim, parte do atual contexto socioeconômico da África de miséria e
exclusão é consequência de fatos passados.
A
escravidão como fenômeno histórico, disperso mundialmente, esteve presente na
história da humanidade, desde a fase final do Neolítico, até períodos mais
recentes. Fato aceito amplamente pelas diversas pesquisas realizadas. Porém, há
muita dificuldade em se obter um consenso quanto à origem da escravidão,
produzindo variadas hipóteses. Ao analisar essa questão Silva (2003), descreve
a tese de Karl Jacoby, em que este argumenta que, o processo de domesticação de
animais, teria servido de modelo para a escravização de seres humanos. Destacando
que o surgimento da agricultura teria gerado a necessidade de mão-de-obra,
obtida através dos prisioneiros de guerra, sendo aplicadas as mesmas formas de controlo
às da domesticação de animais.
Discordando
desta tese, Silva (2003), propõe o inverso, que primeiro homem escravizou o
outro e depois domesticou os animais, argumentando que a experiência obtida na
escravização teria sido aplicada na domesticação. Sem, contudo recusar a
hipótese, de que esses dois processos, possam ter ocorrido conjuntamente, em
algumas culturas. Como exemplo cita, os povos da América e povos antigos da
África subsaariana.
Descreve
que, assim como teria ocorrido com os animais, que ao se aproximar dos homens,
para comer os restolhos de alimentos, acabou acomodando-se a eles. Processo semelhante
teria ocorrido com os sobreviventes de guerras, ficando sem amparo, sem ter
aonde ir, muitas vezes, juntavam-se ao grupo vencedor, reduzidos ao estado
servil.
Destaca
ainda que, provavelmente na África, assim como ocorrera na Mesopotâmia e em
outras partes do mundo, considerou-se mais conveniente não matar mulheres e
crianças dos vencidos. Pois os mesmos poderiam substituir os braços perdidos
nas guerras, aumentando dessa forma o grupo e sua força de trabalho, podendo
ainda tomar lugar de um membro de linhagem no túmulo de chefes mortos, nos
sacrifícios aos deuses e antepassados ou ainda nos ritos da chuva e da
fertilidade.
A
relação que se estabelecia, entre o escravo e seu senhor era de violência,
desde sua origem até o momento que se revelaria quem ia ser escravo em sua
identidade social. Nesse momento, que o escravo se tornava socialmente morto,
sendo arrancado de seu meio, transferido para outro lugar, longe, com outros
costumes, outra fé e outro idioma. (SILVA, 2003)
“Tratava-se,
no entanto de um ser humano diferente, um estrangeiro por natureza, concebido
muitas vezes como distinto e inferior, desenraizado e só de modo lento, e quase
sempre de maneira incompleta, inserido noutro conjunto social. A esse
estrangeiro absoluto, busca a comunidade dominante aviltar, despersonalizar,
infantilizar e despir de todas as relações grupais. E é o fato de ser um
estranho, que perde a família, a vizinhança, os amigos, a pátria e a língua, e
a quem se nega um passado e um futuro, o que permite a redução de pessoa a algo
que possa ser possuído”. (SILVA, 2003, p. 86)
Para
o escravo, destituído de sua liberdade, introduzido em outra sociedade, para
que fosse reduzido à condição de estrangeiro, pois era etnicamente diferente,
era a maneira de negar-lhe direitos e privilégios existentes naquela sociedade,
que diante deste contexto poderia explorá-lo. (LOVEJOY, 2002)
A
onipresença de estruturas escravistas entre os diversos povos do mundo se
justificaria pela repugnância do homem ao trabalho, tida como atividade
constrangedora, que este executa a contragosto, compelido pelas circunstâncias
ou pela coerção. A chave para a felicidade seria a ociosidade prazerosa, por
isso, para obrigar o outro a executar o trabalho que lhe coubera, um grupo com
predominância política e social, usa de violência, para subjugar uma parcela da
população.“A fonte de tiranias políticas em todas as suas formas, da
exploração, em todos os seus contextos, e das opressões sob todas as máscaras,
encontra-se nessa realidade”. (WEDDERBURN, 2007, p. 162)
O
termo escravidão apresenta diversas definições, Silva (2003) a descreve como:
·
Instituição social que consiste
no direito de propriedade sobre seres humanos e na utilização de seus serviços;
·
Domínio permanente e violento
sobre pessoas alienadas de seu nascimento e geralmente desonradas;
·
Vínculo de poder e domínio
originado e sustentado pela violência no qual a “morte social” substitui à
morte física do prisioneiro de guerra, do condenado à pena capital ou do
indigente ou enjeitado.
Lovejoy
(2002) define escravidão como uma forma de exploração com características
específicas, destacando a ideia de que o escravo era uma propriedade, um
estrangeiro, alienado de sua origem ou do qual por sanções judiciais ou outras
se retirava à herança social que lhe coubera ao nascer; que a coerção podia ser
usada à vontade, que sua força de trabalho estava à completa disposição de seu
senhor, que não tinha direito a sua própria sexualidade, e, por extensão às
suas próprias capacidades reprodutivas, sendo sua condição hereditária.
Wedderburn (p.
162-163, 2007) descreve a escravidão como:
“A
mais primitiva forma de coerção destinada a extorquir de um ser humano a sua
força de trabalho em proveito de outro que se dispensa da mesma obrigação.
Trata-se da primeira e mais primitiva das formas de esmagamento do homem pelo
homem, de extorsão da força de trabalho do semelhante, e do confisco de sua
dignidade humana.”
Muito
embora não exista um consenso em definir e catalogar as diversas formas de
escravidão que existiram pelo mundo inteiro, Wedderburn (2007) distingue pelo
menos três grandes categorias:
·
Escravidão doméstico-serviçal,
geralmente baseada nas estruturas de família, abrangendo número limitado de
pessoas na sociedade. Presente na Ásia antiga e “medieval” (China, Japão,
Coréia, Índia, Indonésia); no Oriente Médio semita pré-islâmico; na América
pré-colonial (Olmeca, Inca, Maia, Asteca) e na África.
·
Escravidão econômica
generalizada, surgida historicamente no Mediterrâneo europeu com a civilização
greco-romana, perdurando até o século XV. Nessa estrutura de escravatura, “toda
a sociedade livre” que repousa sobre o trabalho de uma classe de escravos,
violentamente reprimida, vigiada, considerada jurídica e moralmente como
‘coisa’.
·
Escravidão-racial de plantation,
surgida pela primeira vez no Oriente Médio a partir do século IX, desenvolvida
do século XV até o final do século XIX, em todo o continente americano. Apesar
de ser muito parecida com a escravidão econômica generalizada, apresenta uma diferença
importante e substancial onde o estatuto de escravo é reservado exclusivamente
a uma raça alvo – a negra.
Esta
ultima categoria, de acordo com Wedderburn (2007), parece ter surgido da fusão
da escravidão econômica generalizada com a visão raciológica surgida no mundo
árabe, há treze séculos. De acordo com essa teoria racista, os povos de pele
negra, eram vistos como seres inferiores nascidos para serem escravos das
supostas raças superiores de pele branca.
Estudos
revelam que a existência da escravidão na África remonta a antiguidade do Egito,
destacando que, desde a I Dinastia, havia escravos negros, provenientes de
regiões como Núbia, Cordofã e Darfur. (SILVA, 2003) No Egito faraônico, os
escravos eram denominados de “mortos vivos”, sendo propriedade do faraó, este
poderia reparti-los entre os deuses, o clero e a nobreza. Embora possa ter
variado em diferentes épocas, acredita-se que o número de escravos tenha sido limitado,
pois a mão-de-obra mais utilizada era composta pelos “felás”.
“A
escravidão pauta-se por diversas relações de dominação e subordinação do outro,
tornando-o servil, escravizando-o de várias maneiras. A que submeteu os
africanos no século XV tem diferenças flagrantes em relação àquela que existia
anteriormente na Europa e àquela que geralmente se menciona quando se trata da
África anterior à conquista europeia.” (MEILLASSOUX, 1995).
Ao
deparar-se com pesquisas sobre a escravidão na África, Silva (p.80, 2003),
descreve:“[...] teria sido a escravidão reinventada na África – e mais de uma
vez, e em mais de um lugar, e com desenhos distintos. Ignoramos, porém, quando,
como e onde. E as histórias de seu desenvolvimento.”
Para
análise desse fenômeno, é importante ter em mente, que, o processo de escravização
variava, de região para região, de cultura para cultura e de grupo para grupo.
Sendo necessário observar, dentro do contexto histórico, as características
próprias que apresentavam as diversas sociedades, em suas complexas
organizações social, cultural e política.
Outro
aspecto significativo para análise da escravidão na África, é entender a
intrínseca relação entre a escravidão e a questão da terra. A abundância de
terras e a pouca disponibilidade de instrumentos para trabalhála, formava um
conjunto que transformava a mão-de-obra em uma questão essencial. Assim, a
riqueza de uma pessoa era determinada pela quantidade de braços que tinha a sua
disposição para a produção. (SILVA, 2003)
Era
a posse do trabalho – do trabalho familiar e do escravo – o que garantia a
reprodução e a expansão das riquezas. Sendo os escravos o meio mais fácil e
rápido de aumentar o volume de mão-de-obra, a obtenção deles tornou-se a
principal, se não
a
única via para apressar o enriquecimento de um chefe de família, de linhagem ou
de aldeia e singularizá-lo entre os seus pares. E também para fortalecê-lo
politicamente. Pois poderoso era aquele que tinha sob suas ordens grande cópia
de gente em armas. (SILVA, 2003, p. 90)
Na
quase totalidade das sociedades africanas, era rico e poderoso quem possuísse
muitas mulheres e escravos. A terra, tinha-se tradicionalmente como um bem
grupal, com características próprias. Como descreve Silva.[1]
Embora
o processo de valorização da terra fosse diferente, ela não era destituída de
valor. Tanto assim que, o direito de ceder o seu uso estava nas mãos de quem
estava no poder: rei, chefe, cabeça de linhagem. O que transformava o uso desse
controle em uma maneira de manter e ampliar o poder de mando. (SILVA, 2003)
Na
África, a diversidade social que surgira a partir do Neolítico, abrigava povos
pastoris (nômades ou sedentários), povos agricultores, convivendo no mesmo
espaço com grupos organizados em Estados burocráticos potentes, agremiações
étnicas, clâmicas ou confederações tribais. (WEDDERBURN, 2007)
As
pequenas sociedades baseadas na etnia e no parentesco são aceitas como as mais
antigas estruturas sociais africanas. Nestas sociedades, são antigas as
referências sobre distinções de padrões patrilineares e matrilineares. Caracterizadas
por um modo de produção denominado de linhagem ou doméstico, apresentavam
distinções etárias e sexuais. Nelas, o poder político, era baseado na
“gerontocracia”- os mais velhos controlavam os meios de produção e reprodução,
tidos como essenciais para manutenção da sociedade. O forte controle exercido
sobre as mulheres, explica a dependência à sua fertilidade e ao seu trabalho,
pois constituíram, em muitas vezes, a principal mão-de-obra nas atividades
agrícolas. (LOVEJOY, 2002)
Segundo
Lovejoy (2002), a escravidão, nessas sociedades, não era uma instituição
essencial, pois a base de sua formação social, não se alterava. A escravização,
era vista como um dos muitos tipos de relações de dependência, tornando-se um
meio eficaz para aumentar o número de pessoas que desempenhavam as mesmas
funções, de controlar aqueles que não tinham ligações de parentesco e para
aumentar o poder individual ou do grupo.
Junto
a essa categoria, existiam outras formas de dependência, como a do penhor, onde
a pessoa era retirada de seu grupo, como garantia de uma dívida; a categoria
etária – os jovens, que não tinham permissão de participar ativamente das
decisões de linhagem; também eram considerados instituições de dependência, o
casamento e o concubinato. Havia ainda, os dependentes mobilizados de acordo
com o interesse do grupo de linhagem, utilizados no campo, para caça, na defesa
de cidades ou em cerimônias religiosas. (LOVEJOY, 2002)
O
processo de assimilação a uma linhagem, descrito no século XIX, como processo
integrativo, constitui-se em uma questão polêmica entre pesquisadores sobre o
assunto. Segundo Silva (p. 82, 2003), embora estudiosos denominados de
absorcionistas,”negassem que se pudesse falar em escravidão na África, a não
ser entre aspas”, defendendo a tese de que o processo integrativo levava a uma
reumanização do escravizado, ao ser incorporado ao novo grupo social, reduzindo
progressivamente a sua marginalização. Entretanto, ele argumenta que esse
processo, em nada melhoraria a vida daquele que retirado a força de seu grupo,
era reduzida a condição de estrangeiro em outro.
Concluindo
essa questão, Silva (2003) destaca que em boa parte das sociedades africanas,
esse processo assimilativo, não era completo, apresentando diferenças notáveis.
Mas, lembra que este foi mudando ao longo do tempo, acompanhando as alterações
nas estruturas econômicas e de poder. Ao abordar essa forma de escravidão, não
devemos ter uma visão romantizada da mesma. Muitos pesquisadores, ao compará-la
com outros regimes escravocratas, a têm qualificada como branda ou benévola. Argumento
utilizado pelos abolicionistas do século XIX, na tentativa de diferenciar o
escravismo do Novo Mundo, daquele descrito na Bíblia ou na África. Não podemos
dissimular a dura realidade. (SILVA, 2003)
Na
maioria dos casos, ter sido escravo deixava uma marca indelével, uma marca que
se transmitia de geração em geração, como se fosse a sua principal herança.
Esse legado continua até hoje a afligir os descendentes de escravos entre
vários povos africanos, que os discriminam ou tratam com reserva ou desprezo.
(SILVA, 2003, p.84)
Na
colônia de Angola, a exportação de mão-de-obra escrava pelo porto de Luanda
terá sido alvo de competição no século XVII entre portugueses e holandeses. É
depois da disputa entre os colonizadores, cujo vencedor foi o reino de
Portugal, que pode ter se originado a captura direta de escravos, nas chamadas
Guerras Angolanas, no seio de certas tribos que tinham lutado contra os
portugueses. Foi dessa forma que Angola se tornou um centro importante de
fornecimento de mão de obra escrava para o Brasil, onde crescia não apenas a
produção de cana-de-açúcar no Nordeste, mas também a exploração de ouro na
região central. Navios com mercadorias de Goa faziam escala em Luanda lá
deixando panos, as chamadas "fazendas de negros". Dali, seguiam para
Salvador, na Bahia, carregados de escravos e de outras mercadorias provenientes
da Índia (como louças e tecidos). Foi assim que Salvador se tornou um centro
difusor de mercadorias da Índia pela América do Sul.
Os
negócios foram se estruturando aos poucos. Num primeiro momento, os governadores
da colônia detinham o poder de determinar o preço dos escravos. O pagamento era
feito em ouro proveniente de Minas Gerais, no Brasil. Mais tarde, em 1715 a
coroa portuguesa proibiu que os governadores se envolvessem com o tráfico.
Negociantes provenientes do Brasil (principalmente do Rio de Janeiro, da Bahia
e também de Pernambuco) assumiram as rédeas do comércio, que se aqueceu. A
principal feira fornecedora de escravos para o porto de Luanda era a feira de
Kassanje. No século XVIII, a cachaça brasileira (geribita) passou a ter papel
de destaque nas trocas, sendo valorizado tanto em Angola quanto no Brasil.
Figurava, ao lado da seda chinesa e as armas europeias, como uma das principais
moedas de troca. Era, na verdade, a moeda mais corrente, já que o comércio de
armas era controlado e a seda chinesa a só chegava à África depois de passar
por Lisboa, o que elevava seu preço e reduzia sua liquidez. Outro produto brasileiro
valorizado na África era o fumo de corda de Salvador.
A
partir da abertura da costa Atlântica da África, pelos comerciantes europeus,
ocorre um vertiginoso crescimento e expansão do tráfico de escravos, com consequências
decisivas na evolução da escravidão e na economia dessa região[2]. A
similaridade nos padrões comerciais do tráfico de escravos, entre portugueses e
muçulmanos, fica evidente quando analisamos as seguintes características:
demanda de escravos domésticos para a Europa meridional, demanda de escravos
para atender plantações de cana-de-açúcar nas ilhas do Mediterrâneo e depois do
Atlântico, pelo desenvolvimento do comércio de escravos ao longo da costa
ocidental africana e pelas mercadorias exportadas para a África Ocidental.
(LOVEJOY, 2002)
O
desenvolvimento e expansão do comércio transatlântico iniciado na última metade
do século XV representou um importante ponto de partida na história do tráfico
de escravos. Em decorrência desse comércio, a escravidão existente nesta
região, passou por transformações distintas daquelas produzidas nas regiões
islamizadas. Embora ela tenha continuado, na maioria dos lugares, a ser
interpretada no contexto das estruturas de linhagem – como escravidão de linhagem,
ela se consolida como importante instituição nas estruturas das sociedades
locais. Essa relação entre o comércio escravo europeu e o desenvolvimento da
escravidão nas sociedades africanas, ajuda a esclarecer essa mudança histórica.
A presença constante de comerciantes nesta região incentivou a formação de um
comércio sistemático de coleta de escravos, que passava a ser direcionado não
só para os grupos de parentesco, mas também para o mercado exportador. A consequência
dessa relação foi a perda pela África desses escravos e a substituição de seres
humanos por mercadorias importadas. (LOVEJOY, 2002)
Como
uma instituição, a escravidão de linhagem, apresentava aspectos semelhantes a
todos os tipos de escravidão: elemento de propriedade, a identidade estrangeira,
o papel da violência e a exploração produtiva sexual. Porém uma diferença
notável era a ausência no campo ideológico, da influência de atitudes europeias.
Esta ocorreu mais no campo econômico. Ideologicamente, as teorias e práticas
adotadas, seguiam o padrão islâmico. A escravidão continuou a ser compreendida
como de parentesco, mesmo quando escravos realizavam novas e variadas tarefas,
semelhante ao padrão islâmico.
Semelhante
também era o controlo exercido sobre as mulheres. Como a poligamia era
permitida, mas não contava com nenhuma regulamentação, na prática ocasionava
uma distribuição desigual das mulheres dentro da sociedade, o que permitia o
controlo da produção e reprodução. Esse aspecto foi significativo no comércio
de exportação, possibilitando uma divisão natural da população escrava. A
demanda interna africana era por mulheres e crianças, enquanto para o comércio
europeu, homens era a maioria. (LOVEJOY, 2002)
O
crescimento do tráfico transatlântico expôs a África Centro-Ocidental a uma
influência essencialmente nova. Povos ao longo da costa Atlântica experimentaram
mudanças fundamentais em sua organização social, reorientando a escravidão para
padrões bem diferentes do que existia anteriormente, acompanhado de um aumento
interno na utilização de escravos. (LOVEJOY, 2002)
De
acordo com Lovejoy (2002) o abastecimento desse intenso tráfico, para as
Américas, foi realizado principalmente pelas regiões: área de Angola e do Congo
(até quase o final do século XIX); Costa dos Escravos (Golfo de Benin, do final
do século XVII até Século XIX); Costa do Ouro (do início do século XVIII até o
seu final); baía de Biafra (centralizado no delta do Níger e do rio Cross).
Outras regiões tiveram menor participação em épocas diversas como: do rio Bandana;
costa perto do planalto de Futa Jalom; portos próximos onde agora ficam Morávia
e Freetown; e a região da Senegâmbia com conexão com o interior muçulmano.
O
crescimento desse tráfico, não poderia ter ocorrido sem um aumento simultâneo
da capacidade de escravizar pessoas e da intensificação da violência. Essa
situação era resolvida pela separação da infraestrutura comercial, que permitia
a movimentação de escravos dentro e fora da África; e das instituições de
escravização, que estavam associadas à fragmentação política. Assim, o mercado
escravo e a escravização institucionalizada, formavam o cenário para a expansão
da escravidão na África. No princípio do século XIX, o tráfico de escravos,
tinha adquirido proporções gigantescas. O que levou a ser visto como a primeira
das modernas migrações mundiais com características específicas por ser baseada
na escravidão e possuir uma complexa organização. (LOVEJOY, 2002)
Mesmo
aceitando que a escravidão existia na África antes da difusão do islamismo, é
inegável que se constituía em um aspecto marginal as estruturas sociais. O que
leva a afirmar que, a influência do islamismo e do comércio europeu interagindo
com o ambiente nativo, afetaram a dinâmica da escravidão, provocando o
surgimento de sociedades escravocratas, o que equivale dizer que a escravidão
transformou-se em uma instituição fundamental. (LOVEJOY, 2002)
Ao
concluir esta pesquisa sobre a origem do tráfico de escravos em África, foi
possível verificar a importância do mesmo, para entender toda a dinâmica do
processo de escravização e do tráfico de escravos, responsável pela diáspora
dos negros africanos.
O
objetivo da pesquisa que se caracterizou pela análise da escravidão no
continente africano, resultou em novos e significativos conhecimentos sobre a
temática, e, espera-se que o mesmo possa contribuir para o aprimoramento do
trabalho docente.
Ao
final, espera-se que esta pesquisa, proporcione novos questionamentos, a serem
analisados, contribuindo dessa maneira, para o estabelecimento de uma relação
étnico-racial mais harmoniosa, na construção de uma sociedade mais justa e
igualitária.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília, 2005.
DIAS, Jill R.
- O Kabuku Kambilu (c.1850-1900): uma
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História Geral da África -
Volume V: África do século XVI ao XVII
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E. A Escravidão na África. Uma história
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WEDDERBURN,
Carlos Moore. O racismo através da história. Da antiguidade à modernidade.
Copyright, 2007.
[1]
Não
era tida apenas como fator de produção e para uso dos contemporâneos; era a
guardiã dos mortos, a servidora dos vivos e a promessa dos vindouros. Pertencia
a todos eles, sendo teoricamente alocada a quem dela precisasse, pela família,
a linhagem, o clã, a aldeia, a tribo ou o rei. Não tinha valor econômico
próprio, mas do trabalho que nela se punha. Enquanto na Europa a propriedade de
terra era a precondição para que se tornasse produtivo o uso de escravos – e de
servos, e de assalariados -, na África passava-se o contrário: só tinha acesso
a grandes tratos de solo que dispusesse de gente para cultivá-la. (Silva p. 99,
2003)
[2]
As
primeiras caravelas portuguesas se aproximaram da costa da África no Atlântico
nas décadas de 1430 e 1440, alcançando o rio Senegal em 1445. Ao fazê-lo,
abriram uma rota paralela às transarianas. Os portugueses estavam mais
interessados em ouro e escravos, embora tivessem dispostos a comercializar
pimenta, marfim e outros produtos. O seu investimento na exploração da costa
africana era um esforço consciente para evitar os intermediários muçulmanos;
inicialmente eles apenas tiveram sucesso em expandir o comércio transariano já existente,
abrindo a rota marítima; depois, eles participaram no comércio interno africano
como intermediários. Estruturalmente, por conseguinte, tanto os comerciantes
portugueses quanto os muçulmanos exerciam as mesmas funções: eles conectavam a
África subsaariana com o mundo mediterrâneo e participavam no comércio regional
da África Ocidental. (LOVEJOY, 2002, p. 74)
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