quarta-feira, 17 de junho de 2015

O REINO DO BAILUNDO - Trabalho elaborado e organizado por Vieira Miguel Manuel

ÍNDICE






 





O Reino Bailundo foi fundado no Séc. XVII, pelo Soba Katiawala, que chefiando expressivo número de guerreiros, migrou da Kibala.

Foi um Reino que chegou a congregar todos os povos de língua M'Bundo (Umbundo) em estados Federados ao Chefe Bailundo, e que se estendia do Planalto Central, a Benguela e ao Bié. Foram economicamente fortes, explorando e comercializando o milho, o óleo de palma, a cera, o mel e o marfim; trabalharam o ferro, e comercializaram, com muito bons resultados para a economia do estado, os escravos.

Entre os Bailundos, a propriedade da terra era colectiva. Militarmente muito fortes e bem organizados, lutaram de 1645 a 1776 contra a ocupação colonial Portuguesa, praticamente sem tréguas nem concessões.





Entre os Bailundos, a propriedade da terra era colectiva. Militarmente muito fortes e bem organizados, lutaram de 1645 a 1776 contra a ocupação colonial Portuguesa, praticamente sem tréguas nem concessões.

Os Portugueses conseguiam vitórias militares, mas não tinham força de ocupação e eram de novo rechaçados; o governo colonial iniciou então uma política Maquiavélica, que foi instigar as lutas entre os estados Bailundos.

Essa política foi bem sucedida, os estados iniciaram uma série de lutas pela hegemonia e poder, que só teve como consequência enfraquecer internamente o Reino. Essas lutas acirraram ódios tribais, que mais e mais as alimentavam.

O Reino Bailundo fragmentou-se, perdeu a coesão e finalmente, em 1896, foi ocupado pelo exército Português.

Seis anos mais tarde, o Chefe Bailundo Mutu-Ya-Kewela, conseguiu reunir guerreiros e revoltar-se novamente contra o domínio colonial, mas um ano depois foi novamente subjugado.

A partir de 1903, o Reino Bailundo perdeu completamente a expressão política de autonomia, pois as forças coloniais começaram, após o domínio militar, a manipular as sucessões dos monarcas, colocando em lugares de chefia, Sobas simpáticos à causa colonial.

Simultaneamente, autoridades civis administrativas, ajudados por Cipaios – indígenas de força para militar armada, normalmente de outras tribos rivais – controlavam e impediam o reagrupamento e reorganização dos povos subjugados.


Pretendemos, com este trabalho, apresentar alguns factos mais recentes sobre a história do que foi, em tempos, um dos mais poderosos reinos dos estados do planalto, ou seja, o Reino do Bailundo, sem qualquer desprimor para outros estados, importantes que foram e são, quer para as lutas contra a ocupação colonial, quer para o processo da construção da Nação-Estado, em curso, e incluso no grande projecto de edificação da sociedade angolana.

Os estados Ovimbundu, embora os dados de que dispomos apontem para o facto de os mesmos terem sido constituídos muito antes do século XIX, são mais fáceis de descrever a partir dos anos de 1800, sobretudo no que diz respeito aos Estados da Cingolo, Cyaka, Gumba, Kalengue, Kaluquembe, Bailundo, Ndulu; Ngalangui; Sambu, Viye, Wambu, para além dos reinos não menos importantes como o de Caconda (Cilombo Coñoma), Ekekete, Chitata e outros.




REINO
TOPONÍMIA ACTUAL

LOCALIZAÇÃO


PROVÍNCIA
MUNICÍPIO
Mbalundu
Bailundo
Huambo
Bailundo
Cingolo
Cingolo
Huambo 
Bailundo
Ciyaka
Ukuma
Huambo 
Ukuma
Ndulu ou Ondulu
Andulo
Bié 
Andulo
Ngalangui
Galangui
Huíla 
Cuvango
Kalenge
Tchikala-Tcholoanga
Huambo 
Tchikala-tcholoanga
Kaluquembe
Kaluquembe
Huíla 
Kaluquembe
Sambu
Sambo
Huambo 
Tchikala Tcholoanga
Viye
Bié
Bié 
Kuito


Falando, concretamente, do reino do Bailundo, que nos interessa neste nosso trabalho, é de referir que o mesmo perdeu a sua independência em 1896, logo após a morte de Ekuikui II, e durante o reinado de Numa II que o sucedera. E de lembrar que este fora vencido pelo capitão Justino Teixeira da Silva, que, vindo do Bié, o atacou sem dó nem piedade.

A Numa II (assassinado por ordens do jovem capitão Teixeira da Silva) sucederam outros reis, com pouca expressão, como foi o caso de Kalakata e Kalandula. Estes, transidos pelas derrotas, nada fizeram para contrapor com retaliações a impunidade com que os portugueses agiam no reino recém-conquistado. De facto, os comerciantes portugueses agiam com uma impunidade total, sobretudo no que dizia respeito à procura de milho, cera, borracha e de mão-de-obra escrava para a agricultura.

Houve, entanto, um homem, que não era rei, mas que estava ligado à corte do reino do Bailundo, que não esteve para meias medidas. Esse homem chamava-se Mutu-ya-Kevela, que quis pôr freio aos apetites desmesurados dos portugueses. Mutu-ya-Kevela viria a ser dominado e morto em 1902, muito antes do aprisionamento, na região do Bimbe, do seu conselheiro, Samakaka, famoso pelos seus conhecimentos de magia, utilizado, em vão, para ludibriar as forças portuguesas. Dali em diante, os portugueses tiveram um domínio total do “Reino” ao ponto de, por um lado, influenciarem nas sucessões ao trono e, por outro, mobilizarem os reis, agora convertidos em sobetas, para as suas missões mais bizarras como foi, por exemplo, a mobilização dos bailundos, sob o comando do rei Candimba  para a chacina da população dos Seles.

A história do “Reino” do Bailundo, depois de passar por um período de relativa acalmia, viria, no entanto, a tornar-se conflituosa, fruto das convulsões políticas e sociais que se verificaram logo após a ascensão do país à independência e, concomitantemente, a guerra que se seguiu.

O último dos soberanos que regeu o Bailundo, sob a bandeira colonial, foi Félix Numa Candimba, da linhagem do rei Candimba. Félix, durante o tempo colonial e os anos que se seguiram a independência nacional, conciliava a função de rei (soba) com a de contínuo na Escola Primária nº 44, do Município do Bailundo.


Na Angola independente (1976) o Município do Bailundo era governado pelo Comissário Municipal André Ulamba, mais tarde substituído por Chipindula e David Sapata, respectivamente. A nomeação de David Sapata viria a coincidir com a morte de Félix Candimba. É de referir que David Sapata foi nomeado Comissário do Município do Bailundo, no ano de 1977. Tratou-se de um homem que ficou célebre pelo seu carácter sanguinário ao ponto de, segundo se conta, ter tido o desplante de apresentar a certos visitantes ao Município a sua famosa “lavra”, leia-se cemitério.

Como se isso não fosse suficiente, o comissário David Sapata foi a primeira autoridade governamental a subverter os princípios da entronização dos “reis” do Bailundo, segundo os quais, apenas podem ser reis pessoas de sangue azul, ou seja, que possuem a linhagem real. David, sub-repticiamente, favoreceu e contribuiu para que um dos seus amigos, Benjamim Pesela Tchongolola, um granjeiro, se autoproclamasse rei do Bailundo, embora por pouco tempo, porque, em 1979, o comissário David Sapata não sobreviveu a uma emboscada da Unita, que também dizimou centenas de pessoas que vinham com ele na via do Alto-Hama ao Bailundo.

Manuel da Costa (Ekuikui III) - Rei do Bailundo (1977-1998) Ao comissário David, sucedeu Arão Chitekulu. Este, com o intuito de mostrar uma nova face na sua governação, embora não se não se tenha livrado da fama de carrasco, organizou um grupo de Sekulu (mais-velhos) com o fim de tirar Pesela do trono, o que foi conseguido pelas razões atrás apontadas. Apesar disso, o gesto de Arão Chitekulu caracterizou-se, em certa medida, por um igual desrespeito às tradições. É que, Manuel da Costa, o rei escolhido, não pertencia a linhagem dos reis do Bailundo, mas sim dos reis da Luvemba. Fosse como fosse, Manuel da Costa subiu ao trono com o epíteto de Ekuikui III, tendo sido respeitado como tal. O mesmo teve, no entanto, um percalço quando, nos anos 80, foi raptado pela Unita e levado para o antigo bastião do “Galo Negro”, a Jamba. No entanto, pelo que se sabe, mesmo na ali, o mesmo foi tratado com a deferência própria de um rei. Foi nesta qualidade que, em 1992, após as escaramuças que se seguiram as eleições de 1992, a Unita não torcesse o nariz ao facto de Manuel da Costa (Ekuikui III) ter retomado o trono, diante da fuga de um outro rei que lhe tinha tomado o lugar durante a sua ausência, ou seja, Augusto Kachytiopololo, um homem comum, não pertencente a qualquer linhagem dos reis do Bailundo, que foi elevado à categoria de rei por questões essencialmente políticas, com o patrocínio do Comissário Provincial Arão Chiteculo.

Augusto Kachytiopololo, entronizado aquando da estadia de Ekuikui III na Jamba, refugiou-se na cidade do Huambo logo que a Unita fixou a sua direcção nas vilas de Andulo e Bailundo. No entanto, Ekuikui III viria falecer nos finais dos anos 90, mergulhando, de novo, o reino numa crise. Dada a vacatura e, sob a influência do líder da Unita, foi decidido preenche-la com candidatos de sangue azul e da linhagem dos reis de Etunda, Lunge. Recorde-se que fora daí de onde saíra, em 1820, o rei Utondossi que reinara no Bailundo até 1842. Definidas assim as coisas, a escolha recaiu para duas individualidades de sangue azul e da linhagem real dos Utondosi: Alice Ngueve Simões (mãe do embaixador e ex-presidente da bancada da Unita, Alcides Sakala Simões), e Jeremias Lussati, a quem se decidiu entregar o trono, com o epíteto de Utondossi II.




Augusto Kachytiopololo (Ekuikui IV) Com a morte do líder da Unita, o fim da guerra e a re-proclamação de Augusto  Kachytiopololo para rei, com o epíteto de Ekuikui IV, O “reino” do Bailundo entrou na sua fase mais crítica, cuja nota predominante é a vassalagem total ao Mpla e JES. Daí que o passo a seguir, conforme foi orquestrado por essa força política, com o beneplácito de Augusto Kachytiopololo, foi a eliminação física de Utondossi II, o que se conseguiu, em 2008, como consequência de um atentado sofrido em 2007 na localidade de Lunge, onde vivia.


“O reino que chegou a congregar todos os povos de língua “umbundo”, e, que se estendia pelo planalto central, é considerado um dos grandes reinos tribais dentre muitos que existiram efectivamente em Angola. Bailundo marcou positivamente a história do país e de África, sendo que até hoje, o mesmo carrega algumas particularidades, dentre elas às inúmeras transições de reinado e pelo facto de ser o reino que foi um baluarte da resistência contra a ocupação efectiva portuguesa”, disse o historiador Olivio Kilumba.

Segundo o historiador Olivio Kilumbo, não se tem de facto uma data consensual da fundação do reino Bailundo. Sendo que, e, com divergências de pensamento, vários historiadores afirmam ser no século XV, outros defendem que seja fundado no Século XVII.

Apesar da história do reino do Bailundo ser apresentada com certos contrastes, de factos, historiadores defendem que o mesmo sempre foi forte e que sobe resistir durante séculos às inúmeras tentativas de conquista pelos colonos portugueses principalmente pela forma clara e coesa da sua organização em quase todos os domínios.

Para o historiador, o reino do Bailundo sempre foi considerado uma propriedade de todos, daí a razão de inúmeras batalhas que duraram mais de 100 anos (1645 a 1776) contra a ocupação colonial portuguesa.

O historiador esclarece que os colonialistas alcançavam vitórias militares, mas a falta de força de ocupação, os mesmos eram rechaçados novamente. Daí nasce a opção dos portugueses na divisão interna do reino, o que de um modo geral criava discórdia entre os Estados Bailundos.

Kilumba, explica que a partir de 1903 século XX, o reino Bailundo perdeu completamente a expressão e autonomia política, pois as forças coloniais começaram, após o domínio militar, a manipular as sucessões dos monarcas, colocando em lugares de chefia, Sobas simpáticos à causa colonial.


Bailundo sempre esteve do ponto de vista económico organizado e com pontos fortes, sendo que, a insegurança que o rodeava foi capaz de o tornar fraco organizacionalmente. “o reino do Bailundo sempre foi forte do ponto de vista económico. O cultivo de diversos produtos e a comercialização do milho, óleo de palma, a cera, o mel e o marfim, a metalurgia da época facilitou o uso devido do mineral ferro que trabalhado, era comercializado, contribuindo para a economia do Estado”, defende Olivio Kilumbo.


Sobre a transição de poderes, o professor de história explica que os reinos pressupõem monarquias, sendo que a sucessão vem da linhagem familiar dos que reinam, ou seja, o filho primogénito e legítimo do rei, é o herdeiro do trono.

Para o professor, isto aconteceu em todos as monarquias e até hoje assim acontece por todo o mundo monárquico. Logo, o reino do Bailundo não era exceção razão pela qual entre 1876 e 1893, reinava no Bailundo Ekuikui II, substituto de Ekongo-Lyo-Hombo, quando o reino entrou em grande alvoroço.

Questionado sobre a importância do reino do Bailundo para a nova geração, o historiador respondeu que trata-se da nossa história e que devemos conhecê-la porque um povo que não conhece sua história corre o risco de repeti-la.

“Historicamente o reino do Bailundo representou a forma clara de como os vários povos de Angola resistiram a ocupação colonial, que deve traduzir-se como motivo de orgulho a novas gerações”, remata o historiador.

O historiador adverte ainda a necessidade de se realizar expedições arqueológicas e históricas, usando as fontes orais, escritas e materiais para que se possa informar aos jovens de hoje e aos de amanhã qual foi o contributo directo e indirectos dos reinos para a formação de Angola e do próprio nome do país.

Actualmente o reino do Bailundo vive uma crise profunda, que segundo o historiador deve se pela morte do rei Ekuikui IV, autoridade tradicional máxima do reino do Bailundo. Augusto Kachytiopololo era o nome de baptismo do ancião que faleceu aos 94 anos, vítima de doença. O seu antecessor foi Manuel da Costa (Ekuikui III) que governou o Bailundo entre 1977 e 1998.

O reino do Bailundo é actualmente reinado pelo Armando Francisco Kalupeteca, conhecido como Ekuikui V, tem 38 anos, tendo subido ao trono no dia 13 de Abril de 2012.






A coragem e a bravura dos ancestrais, de acordo com a matéria considerada até agora, devem inspirar as actuais e futuras gerações, para que o povo angolano seja cada vez mais unido e firme nos seus ideais, de forma a não se deixar subjugar por qualquer força externa.






José Redinha, Etnias e culturas de Angola, Luanda: Instituto de Investigação Científica de Angola, 1975

Davidson, B. (1981). Os africanos. Lisboa; Edições 70 para o Inald.

Lukamba, A. (1987). Evangelização, encontro vivo na cultura umbumdu de Angola.


Publicações culturais, Volumes 69-71. Companhia de Diamantes de Angola, 1965.

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